Vai ter comida para todos?

Por Rosenildo Ferreira, para COALIZÃO VERDE (1 Papo reto, Cenário Agro e Neo Mondo)

Em geral, os ecologistas abordam a questão do aquecimento global a partir dos efeitos deletérios nos ecossistemas. As seguradoras concentram o debate nos recorrentes prejuízos causados por eventos extremos, como furações, cujo aumento da intensidade vêm deixando um rastro cada vez maior de destruição. Por sua vez, a cientista Nina Fedoroff, especialista em biologia molecular, optou por analisar os impactos que as mudanças climáticas estão causando na vida das pessoas. Especialmente no que se refere ao acesso a um bem preciso: a alimentação. “Como faremos para saciar a fome de 10 bilhões de pessoas em meio aos efeitos causados pelas mudanças climáticas na produção de alimentos?”, provoca, para em seguida emendar: “Uma das opções são as sementes geneticamente modificadas”.

Foi para falar deste tema que a cientista desembarcou no Brasil, no início da semana. Seu principal palco foi o seminário internacional “O Futuro da Alimentação”, promovido pelo Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB) e a revista Scientific American Brasil, em São Paulo.

Na véspera da palestra, Nina se reuniu com um seleto grupo de jornalistas. No encontro, ela destacou o papel das mudanças climáticas até mesmo no equilíbrio geopolítico do Oriente Médio. “A guerra da Síria é fruto direto da migração forçada de milhares de pequenos produtores agrícolas e camponeses, devido à seca (ocorrida entre 2006 e 2011)”, avalia. “Deslocadas de suas vilas para as cidades, onde não receberam assistência do Estado, eles acabaram engrossando as fileiras dos opositores ao regime”.

Para a bióloga, que atuou como conselheira científica do Departamento de Estado nas gestões de George W. Bush e de Barack Obama, uma das respostas para enfrentar o desafio da produção de alimentos é o uso mais intensivo da ciência. Esse papel, segundo Nina, depende da ação coordenada de governos e empresas. “O desenvolvimento de um organismo geneticamente modificado custa US$ 100 milhões, montante que as universidades e os pesquisadores jamais teriam como gerar”.

Apesar de largamente difundidos e utilizados em todo o mundo, desde seu lançamento, em 1994, os alimentos transgênicos continuam causando polêmica. Especialmente na Europa, onde diversos países impuseram restrições ao plantio de sementes com estas características. Para o cientista sueco Stefan Jansson, especializado em biologia vegetal, a questão sempre esteve muito mais no plano político que no científico. “O debate está cercado de preconceitos e motivações protecionistas”, lamenta. “Muitos ecologistas admitem que estavam errados em condenar os transgênicos. Contudo, não sabe como admitir isso”.

Apesar das pressões de ONGs, o Brasil se converteu num dos principais consumidores de sementes transgênicas. Especialmente nas lavouras de soja, milho e algodão. Estudo elaborado pelo Serviço Internacional para Aquisição de Aplicações de Agrobiotecnologia (ISAAA) coloca o país na segunda posição num ranking liderado pelos Estados Unidos.

Aqui, nada menos que 94% da colheita realizada nestas três culturas provêm de sementes transgênicas. Em termos globais, os 50 milhões de hectares brasileiros representam 26% de toda a área cultivada com uma ajudinha da biotecnologia. “O papel dos órgãos reguladores neste processo é importante”, destaca Adriana Brondani, diretora-executiva do CIB. “Aqui, o debate leva em conta aspectos científicos”.

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Sobre o efeito dos transgênicos na agricultura brasileira

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Sobre a seca extrema e a guerra da Síria