É preciso ter o dom para ser professor?

A ideia de que é preciso ter o dom para ser professor não me convence. Se fulano é bom professor é porque nasceu com o dom. É raro encontrar quem saiba dizer o que é o dom, mas não há quem discorde que ele é a garantia do sucesso. O “dom” é o “dom”. Portanto, você precisa ter, não precisa saber o que é.

Arrisco dizer que o  dom é como um kit com todos os atributos necessários para se dar bem no que faz. É como ter qualidades inexplicáveis. Com esse kit, não é preciso esforço, pois ele garante que tudo sempre vai dar certo.

Entretanto, vejo que no “kit dom” de alguns professores, que dizem ter nascido para dar aula, falta algo ou está com defeito. Eles não param de reclamar da profissão e dos alunos.

– O aluno não quer nada com nada, e depois a culpa é minha. No meu tempo não era assim, a escola era para quem queria estudar. Agora, qualquer um entra na escola e é por isso que está desse jeito.

Será que é possível fazer um reparo no “kit dom” desse profissional? Creio que não.

O problema não está somente na fantasia de acreditar no “dom”, mas também em não se reconhecer na profissão.

Ser professor não é natural e muito menos um dom. Não há quem nasça professor, porém há quem se torne. Ser professor não é uma vocação, mas uma escolha profissional.

Ser professor exige anos de estudo e aplicação. É preciso sentar a bunda na cadeira e ralar muito.

A fantasia do dom leva à crença na superioridade, e é o que ocorre com alguns professores. Eles sempre estão certos, eles se acham na condição de missionários que vão levar a verdade/salvação ao aluno.

Não ter o dom é não é ignorar que nenhum aluno chega ou sai da escola pronto. Não ter o dom é encarar a profissão como uma construção social a qual requer anos e anos de estudo e dedicação. Não ter o dom é reconhecer que o perfil do aluno mudou porque a escola deixou ser um privilégio para poucos para ser um direito de todos.
Não ter o dom é não ser acomodado.