Essa é massa

A relação entre aquecimento global, desenvolvimento sustentável e a estratégia de negócio das empresas nunca esteve tão evidente quanto agora. E isto vem sendo captado em inúmeros estudos e levantamentos feitos no Brasil e no exterior. Um deles, a versão 2014 da pesquisa da consultoria Carbon Disclosure Project (CDP) ajuda a mostrar este fenômeno de forma mais eloquente.

As 52 empresas públicas e privadas brasileiras que participaram do levantamento economizaram um total de R$ 118,7 milhões, com a adoção de mecanismos para reduzir suas emissões de CO2. Para isso investiram R$ 3,7 bilhões em projetos, boa parte deles relacionados a melhoria da qualidade da fonte de energia utilizada em suas operações. Apesar de os desembolsos terem sido 38% menores, em relação a 2013, as emissões de CO2 deste grupo caíram 103%.

Para “limpar” sua equação energética, o setor produtivo vem recorrendo fortemente à diversificação das fontes. Por conta disso, crescem as chances de a biomassa (que inclui a queima da madeira de reflorestamento, de restos florestais e de sobras da produção agrícola) assumir um papel ainda mais relevante na matriz energética brasileira. E mundial. Pelo menos é o que aponta o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), elaborado no âmbito do movimento Sustainable Energy for All, que prevê que, até 2030, entre 40% e 60% de toda energia renovável do planeta será extraída da biomassa. Especialmente em projetos de cogeração de energia.

Uma das empresas que estão embarcando nessa onda é a americana Dow, da área petroquímica. Nada mais natural para quem tem esse atributo em seu DNA. É que o fundador da companhia, o canadense Herbert Dow, foi pioneiro em pesquisas e no uso da cogeração, na década de 1890. Cento e vinte e quatro anos depois, a cogeração foi a tecnologia escolhida para que a filial Brasil melhore seu equilíbrio energético e aumente o nível de competitividade da planta industrial situada em Aratu (BA), a maior da Dow do país.

Para isso fez uma parceria com a ERB – Energias Renováveis do Brasil, que constrói e opera usinas de cogeração de energia, alimentadas com biomassa proveniente de florestas próprias. O acordo com a Dow resultou no investimento de R$ 265 milhões na construção de uma termelétrica para a produção de energia e geração de vapor, a partir da queima de eucalipto. O projeto está garantindo 700 empregos diretos. “Nosso objetivo com esta operação foi melhorar a competitividade da empresa, algo vital em um setor muito sensível a preço”, explica Claudia Schaeffer, diretora de energia e mudanças climáticas da Dow Brasil. Do ponto de vista ambiental, a Dow deixará de emitir 180 mil toneladas de CO2 por ano. Processo semelhante de troca de insumo por uma opção mais verde será feito na unidade do Guarujá (SP), na qual o óleo combustível será substituído pelo gás natural.

Mais que apenas o desejo de ficar “bonita na foto”, o esforço da filial da Dow para limpar sua matriz energética se insere em uma determinação global da corporação. “Faz tempo que os dirigentes da empresa mudaram sua forma de enxergar o mundo, fazendo questão de estender a política de sustentabilidade até para o dia a dia dos funcionários”, conta a executiva. É que em meio a este processo, os trabalhadores de todos os setores são instigados a sugerir projetos e processos que permitam reduzir o gasto energético de um conglomerado que consome 12 Gigawatts, por ano, o equivalente à capacidade de produção da Usina Binacional Itaipu. Estas medidas vêm garantindo resultados expressivos. “No período 1990-2000, a intensidade energética da Dow foi reduzida em 40%, em termos globais.”

Uma das que pretendem surfar na onda de projetos de biomassa é a também americana NexSteppe, da área de biotecnologia. Seu trunfo para conquistar a preferência dos potenciais clientes é o sorgo. Mas não o grão usado tradicionalmente na rotação de culturas ou como complemento da alimentação de animais. O que propõem os cientistas é uma variedade “vitaminada”, batizada de Sorgo Biomassa, que pode ser queimada diretamente em caldeiras. As pesquisas de campo foram feitas em solo brasileiro e se estenderam por três anos. Os resultados, pelo visto, agradaram.

“Já ficou claro que o produto é competitivo”, destaca Tatiana Gonsalves, vice-presidente comercial da NexSteppe para a América Latina. “A produção de 100 toneladas de forma experimental, resultou na encomenda de sementes suficientes para a produção de 600 toneladas”. Conhecida com “cultura explosiva”, essa variedade fica em ponto de colheita em apenas 120 dias. Até chegar neste estágio, a equipe comandada por Tatiana deu duro.

Os testes incluíram todas as etapas da produção, inclusive sua aplicação no abastecimento de fornos usados para a secagem de grãos. Também foram analisados itens como as condições ideais de colheita, armazenagem e a quantidade de cinzas resultantes.

O objetivo é usar este sorgo também como opção à queima do bagaço de cana de açúcar. Isso porque, com o crescimento dos projetos de etanol de segunda geração, o bagaço deverá ficar escasso. “A venda de energia deve ser transformar em um grande business para as usinas, em épocas de queda da cotação do etanol”, aposta a vice-presidente da NexSteppe. Segundo ela, o sorgo desenvolvido pela empresa nasceu com a função de gerar energia, e por isso não existe nenhum risco de ele concorrer com a produção de alimentos. A cultura é rústica e aguenta climas severos, nos quais a produção de alimentos nem sempre é viável.

Benefícios também para o agricultor, que poderia usar a planta dentro do processo de diversificação de uso do solo e de fontes de receita. “O lucro líquido fica em torno de R$ 800, por hectare, número atrativo para o setor”, destaca a executiva.

O esforço da empresa americana de trazer esta pesquisa para o Brasil se deve à força agrícola do país. A meta é aplicar os resultados obtidos por aqui nos demais países emergentes. Afinal, crescimento depende de oferta de energia. Em abundância e com preço competitivo.