Setor de embalagens de aço avança nos índices de reciclagem

O Brasil é o país das contradições em diversos aspectos. Determinados estratos da sociedade vivem em condições semelhantes as dos europeus, enquanto outros estão num patamar bem próximo ao dos indianos de baixa renda. Os inúmeros contrastes dessa Belíndia, expressão criada pelo economista Edmar Bacha, nos obrigam a analisar com acuidade o que acontece em diversos aspectos na esfera social e econômica. Em matéria de reciclagem, por exemplo, o Brasil consegue rivalizar com Estados Unidos e Alemanha, dependendo do item analisado. Mesmo quando lembramos que apenas uma pequena fração dos resíduos gerados no Brasil entram em um cadeia organizada de reaproveitamento.

De acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil, elaborado pela Abrelpe, em 2018, foram gerados 79 milhões de resíduos sólidos, o que equivale a 380 quilos por ano, por cada habitante. Desse total, 59,5% foram destinados a locais apropriados: aterros sanitários. Mais. O índice de reciclagem segue no ridículo patamar de 3%, decorridos 12 anos de aprovação da Lei de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/10). Um dos dispositivos desta legislação previa que chegaríamos a um índice de 20% de reciclagem em cinco anos.

Mesmo com todos os problemas, que não são poucos, pode-se dizer que temos o que celebrar no Dia Mundial da Reciclagem, instituído pela ONU em 17 de maio. Afinal, somos líderes mundiais em reciclagem de alumínio e de embalagens de defensivos agrícolas, por exemplo, superando os Estados Unidos e a Alemanha. Além disso, diversos setores vêm renovando seus esforços e aderindo aos dispositivos da Lei nº 12.305/10. Um deles é o de latas de aço.

1 Papo Reto conversou com Thais Fagury, presidente da Associação Brasileira de Embalagem de Aço (Abeaço), para conhecer o que as empresas do segmento têm feito.

No que o Brasil se destaca no cenário continental e global, no quesito reciclagem de latas de aço?

A reciclagem do aço e de latas é bastante parecida em todo mundo. A movimentação de sucata e a destinação final do aço pós consumo são invariavelmente feitas pela usina siderúrgica. O destaque para o mercado brasileiro vai para o tamanho territorial e para o trabalho executado pelas cooperativas de catadores de materiais recicláveis. Mesmo nos lugares mais afastados, a reciclagem das latas de aço é possível, visto que já há um mercado extremamente estruturado para a captação de sucatas de aço e destinação às usinas siderúrgicas (recicladoras). O trabalho executado pelas cooperativas, hoje, proporciona capilaridade e também profissionalização em relação ao material.

O Brasil supera os Estados Unidos e a Alemanha na reciclagem de vasilhames de defensivos agrícolas e latas de alumínio. O que falta para que as latas de aço tenham uma maior presença no processo de reciclagem?

Falta a garantia da rastreabilidade do material. Uma das propostas do Programa Prolata é justamente garantir a rastreabilidade da lata de aço, por meio da transparência e da formalização do sistema, passando por toda a cadeia até o destino final ambientalmente adequado (usina siderúrgica - reciclagem mecânica do material).

No ano passado, a Prolata lançou uma campanha de recolhimento de embalagens vazias em diversas cidades do país. Qual o balanço dessa atividade e os próximos passos?

 

 

 

Associação sem fins lucrativos criada em 2012 pela cadeia de valor dos fabricantes de latas de aço no Brasil, a Prolata reciclou em 2019 8.059,6 toneladas de aço por meio de 51 cooperativas e 37 Pontos de Entrega Voluntária (PEVs) espalhados pelo país. Para o meio ambiente, os resultados também são relevantes: no acumulado de 2019, a extração de minério de ferro para produção de aço foi reduzida em 12 mil toneladas e a de carvão mineral em mais de 1.200 toneladas. Além disso, a emissão de gases do efeito estufa diminuiu em 29.822 m³ com o uso de aço reciclado. Esses números representam 164.247 árvores que deixaram de ser cortadas e uma economia de 70% de água na fabricação de novo aço.

O objetivo da Prolata é criar condições para que a cadeia de reciclagem da lata de aço se complete, envolvendo os fabricantes de latas, fabricantes de produtos, cooperativas, consumidor final e indústria siderúrgica, garantindo a responsabilidade compartilhada da cadeia prevista pela Política Nacional de Resíduos Sólidos. Os próximos passos são aumentar a capilaridade do Programa incluindo um número maior de entrepostos, engajar o consumidor por meio de ações como porta a porta em conjunto com as cooperativas parceiras, e trabalhar educação ambiental, principalmente na rede pública de ensino, ou seja, comunicar, educar e facilitar o descarte das latas de aço pós consumo.

Com o distanciamento social, o confinamento e o lockdown em algumas cidades, por conta da COVID-19, cresceu o volume de refeições no lar e, consequentemente, muitas famílias passaram a separar os resíduos sólidos. Foi detectado algum aumento no caso das embalagens de aço?

Ainda não conseguimos identificar este aumento em relação a geração do resíduo pós consumo. Em outros países, acompanhamos o aumento no consumo de alimentos enlatados. Nos EUA, por exemplo, o aumento foi de cerca de 28%, porém, nada se falou sobre a destinação dos resíduos. Esta é uma das preocupações do Programa Prolata hoje, visto que boa parte das cooperativas estão inoperantes ou com funcionamento parcial, bem como PEVs e entrepostos parceiros. Primeiro seguiremos as recomendações da OMS e depois trabalharemos fortemente para garantir a recuperação dos resíduos.