Oui, Carrousel du Louvre

Em meados de novembro de 2016, o paulista Cláudio Gatti, 45 anos, especializado em fotografia corporativa, navegava nas redes sociais quando deu de cara com uma sequência de fotos sobre parto humanizado. De imediato, ele ficou encantado com a plasticidade das imagens que retratavam com realismo e ternura aquele momento tão marcante. Na sequência, outra surpresa: as fotografias estavam expostas na galeria Heclectik-Art, situada no Carrousel do Louvre, área que fica no subsolo do icônico Museu do Louvre, em Paris. A partir daí, ele passou a se inteirar melhor sobre este destacado espaço.

Entre os dias 20 e 22 de outubro, sete retratos clicados por Gatti vão ocupar as paredes do stand da Heclectik-Art no Salon International d´Art Contemporain, no Carrousel du Louvre. A negociação com a curadora Heloiza Azevedo, responsável pelo local, foi rápida. Entre o primeiro contato telefônico, ocorrido no final de novembro, e o convite para expor se passaram menos de 30 dias: “Minhas fotos impressionaram tanto a curadoria que eles decidiram incluir outras 16 imagens num catálogo de arte que será distribuído nos principais museus da Europa”, destaca Gatti.

De fato, pode-se dizer que ele criou um estilo próprio e bastante criativo de fotografar altos executivos. Muitas das imagens têm um quê de inusitado e resvalam no limite do exagero, especialmente para quem não tem a possibilidade de ler as reportagens associadas as fotos. Na TV 1 Papo Reto (o player de vídeo existente na homepage do site) é possível assistir a série de quatro vídeos que contam um pouco do processo criativo do fotógrafo.

“Existe uma linha tênue entre o ridículo e o inusitado/criativo”, pondera. “Tenho certeza de que nunca cruzei esta linha, pois sempre trabalhei no campo da arte e do fotojornalismo”. Um dos indicativos disso é que todos, rigorosamente todos, os empresários e CEOs retratados se tornaram amigos do fotógrafo.

A lista é longa e inclui bilionários conhecidos pelo perfil austero, como Abílio Diniz, ex-controlador do Grupo Pão de Açúcar, Antônio Ermírio de Moraes (1928-2014) e Carlos Wizard (dono do Grupo Multi); CEOs de empresas caretas, como Cleodorvino Belini (ex-presidente do Grupo Fiat), William Lee, CEO da Hyundai Motor Brasil, Guto Mocellin Neto, CEO da água Ouro Fino e David Barioni Neto, ex-presidente da TAM; até empreendedores descolados, como  Pedro Furlan, CEO da Native.

Para viabilizar o projeto, Gatti foi bater às portas dos departamentos de marketing de algumas empresas cujas fotos dos executivos ilustraram reportagens feitas para as revistas IstoÉ DINHEIRO e DINHEIRO Rural, publicações nas quais sua carreira deslanchou. A prospecção se dava nos poucos momentos de folga, depois de concluir as pautas do dia, ou no intervalo para almoço. O resultado não foi o esperado. “Quando se trata de patrocínio cultural as empresas são muito engessadas”, diz. “No final, os recursos foram obtidos a partir de patrocínio pessoal de alguns dos personagens das fotos”.

Quem convive no plano pessoal ou profissional com Gatti descobre rapidamente estar diante de uma pessoa cujos traços marcantes são tenacidade e paixão pela fotografia. Como ele não existe tempo ruim. Trata todos os personagens e pautas (jargão usado para designar o processo de produção de uma reportagem) como se fossem dignos de figurar na capa e uma revista de prestígio. Do microempresário dono de uma confecção emergente até altos executivos e controladores de impérios avaliados em muitos bilhões de dólares.

Parece até que Gatti nunca fez outra coisa na vida além de fotojornalismo!

Mas não é bem assim. Nascido em Mogi das Cruzes, cidade da Região Metropolitana de São Paulo, conhecida pelo cultivo de hortifrútis, indústria mecânica e também como polo universitário, o caçula de 12 irmãos “perdeu o rumo” aos 12 anos, quando do falecimento de seu pai João Gatti, que criou a família trabalhando como pedreiro na Rede Ferroviária Federal. Gatti largou os estudos e entrou num processo de recolhimento. Recuperou o eixo graças à acolhida da família e os conselhos do primogênito Ênio.

Aos 16 anos, ingressou no setor de audiovisual da Universidade Braz Cubas, onde aprendeu aos poucos a técnica da fotografia. Por ser funcionário teve direito a bolsa integral de estudos. Mas o único curso existente no período da manhã era engenharia mecânica. “Apesar de nunca ter gostado de estudar, eu sempre fui bom em cálculos. Então decidi me matricular”, conta. Mas não concluiu o curso. Migrou para matemática e largou a universidade no último ano.

Àquela época, a fotografia já ocupava boa parte de seu tempo e de sua cabeça. Mesmo que ele não tivesse plena consciência disso. Isso porque, fora transferido para o departamento de arquitetura e depois para o laboratório de comunicação social. Após 10 anos na universidade, ele decidiu dar uma guinada na carreira. “Pedi demissão e vim para São Paulo tentar a sorte como fotógrafo”. O dinheiro amealhado com a rescisão trabalhista foi usado na aquisição de um equipamento profissional, comprado na histórica rua Conselheiro Crispiniano, na região Central de São Paulo.

De máquina em punho e já com 27 anos, Gatti percorreu algumas redações atrás de trabalho. A primeira oportunidade surgiu numa nascente revista de turismo, cujo nome não revela. “Fiquei um ano neste trabalho e até hoje não me pagaram o que me deviam”. Entre um contato e outro, acabou entrando no universo da cobertura do mundo das celebridades.

Primeiro na líder de mercado, a Caras, da Abril, depois na emergente IstoÉ Gente, que circulou entre 1999 e 2015. Foi nesta última que seu trabalho começou a adquirir uma linguagem própria. “Nunca me conformei em retratar os famosos da forma convencional. Sempre busquei um ângulo diferente, nem que para isso tivesse de tirá-los do evento ou da festa para clicá-los em outro local, na mesma noite”, explica.

A mesma disposição de ousar foi levada para o mundo da economia e dos negócios, um dos últimos bastiões da caretice e mesmice em matéria de fotografia. Gatti diz que apesar de não ter conseguido o equilíbrio financeiro em sua carreira, ele se senti feliz por fazer exatamente o que gosta. Para ele, não tem tempo ruim. “Saio sai de casa, em Mogi das Cruzes, com um sorriso nos lábios e a mesma disposição de quando comecei na carreira de fotógrafo”, garante.

Bon voyage, Cláudio Gatti!

 

“Um conjunto fotográfico de pura expressão humana”

Em entrevista por telefone, Heloiza Azevedo, curadora da mostra que inclui as fotografias do paulista Cláudio Gatti, fala sobre a importância da fotografia no cenário global de artes plásticas. Fundadora da Heclectik-Art Galerie, ela atua como comissária de arte, produtora cultural e biografa e se firmou como uma das maiores incentivadoras da arte brasileira na Europa.

Qual foi sua primeira impressão ao conhecer o trabalho do Claudio Gatti?

Quando vi pela primeira vez os trabalhos, ao mesmo tempo em que escutava seu relato de como cada foto foi feita, eu senti emoção. Além da criatividade em retirar grandes executivos e empresários de seus postos para fotografá-los em cenas montadas por ele, em tão pouco tempo, com muito bom humor, sutileza e dinâmica, me encantei também com a história de vida de cada personagem e tudo que havia levado Gatti a escolher o tipo de foto a ser feita, em cada ocasião. Em todas elas eu reconheci os pontos importantes que compõem a arte: emoção, criatividade, domínio do assunto, composições visuais com harmonia e valores estéticos, técnica de comunicação, enfim um conjunto fotográfico de pura expressão humana.

Como você se tornou curadora da na galeria Heclectik-Art?

Trata-se da realização de um sonho que se iniciou a partir do momento que passei a morar na França. Sempre quis caminhar na minha profissão com princípios que me colocassem em contato com as diversas linguagens artísticas e com tudo que a arte é capaz de agregar de positivo no outro e nos dias em que vivemos. Faz 10 anos que venho buscando talentos e caminhos onde o artista e sua arte possam ser vistos em espaços importantes, com uma significação importante na trajetória de cada um.

Qual será o destino das imagens de Gatti que participam da mostra?

A imagens expostas no Salon International d’Art Contemporain no Carrousel du Louvre em Paris integram a série que batizei de “Quando o Empresário Vira Arte” mostrada numa catalogação que será lançada na mesma ocasião. Além de Gatti, mais 32 artistas, a maioria brasileiros, estarão participando do Salon e da catalogação, no stand da Heclectik-Art Galerie.

O Gatti falou sobre um Guide que deverá incluir outras obras dele. Como será este trabalho?

O Guide de Catalogação de Obra de Arte, que publico anualmente. A função dele é de catalogar oficialmente dentro do mercado de arte o artista e suas obras em dois idiomas: inglês em francês. Essa publicação é distribuída a galerias e museus, além de ser enviada para arquitetos, colecionadores e admiradores de arte e se tornou uma referência em matéria de arte brasileira. Nesta sexta edição, que será lançada no vernissage, Gatti vai participar com 12 páginas e 16 fotografias que darão uma visão maior da série “Quando o Empresário Vira Arte”, de C.G.

Pode-se dizer que a fotografia está em alta em Paris e na Europa?

A fotografia é um estilo/linguagem de arte que atualmente está sendo empregada em vários setores aqui na Europa e em outros continentes. Ela pode ser impressa em diversos suportes que vão desde o papel, a madeira, o plexiglass, o alumínio, o vidro e o PVC. No mercado de arte ela é bem-vinda em alumínio e plexiglass. Nesta edição, meu stand contará com seis profissionais no domínio da fotografia, além de Gatti, e todas as fotos serão impressas em alumínio. Nesse salão de arte é o sexto ano que levo grupos de artistas. Mas, desde 2008, são 48 participações com minha curadoria em salões, exposições coletivas e individuais em galerias e leilões públicos de arte com a minha organização. Em todos eles a fotografia está presente, além da escultura, da pintura, do grafitti-art, de gravuras e de desenhos.

Sobre a mostra Parto Humanizado

Sobre o trabalho de Cláudio Gatti

Sobre a Heclectik-Art Galerie

*Nota do editor: trabalhei por 18 anos na IstoÉ DINHEIRO onde tive a oportunidade de dividir inúmeras pautas com o fotógrafo Cláudio Gatti. Neste período, fui testemunha de seu empenho e de sua paixão pela fotografia. De fato, um profissional de raro talento e elevada capacidade técnica.