Na noite de 22/2, domingo, uma história chamou a atenção em meio à festa de entrega do Oscar. E não tinha qualquer relação com o vestido de determinada atriz ou mesmo com o novo visual de um galã de Hollywood. Estes aspectos foram marcantes. Como também a receptividade ao documentário “Virunga”, que disputava a estatueta na categoria. Quem assina a produção desta obra caprichada, que narra a vida de ambientalistas e guardas florestais para salvar gorilas em meio a mais uma guerra civil na República Democrática do Congo, é ninguém menos que o eterno galã Leonardo Di Caprio.
Esta saga (que pode ser conferida na internet ou nos serviços de vídeos por streaming, como Netflix) foi vivenciada por Giuliana Preziosi e Maurício Cichitosi, o casal de brasileiros que comanda o projeto “Histórias Pelo Mundo”. A seguir o delicioso texto preparado por eles para a edição 45 da parceira de 1 Papo Reto, a revista Plurale.
“Na luta contra a extinção, os gorilas das florestas da África central representam uma das espécies mais ameaçadas do Planeta. Atualmente apenas cerca de 600 vivem nas florestas dos vulcões de Virunga, na fronteira de Uganda, Congo e Ruanda, e na floresta de Bwindi, no Sul de Uganda.
Segundo último relatório da UNEP (The Last stand of the Gorilla), é possível encontrar dois tipos de gorilas na África. Os gorilas-das-planícies são os que vivem no Parque Kahuzi-Biega, na República Democrática do Congo, cuja população estimada é de cerca de 5 mil gorilas. E os gorilas-das-montanhas, que ficam Floresta de Bwindi e no Parque Virunga, cuja população gira em torno de 600 gorilas.
Infelizmente, eles estão ameaçados por culpa da ação humana. Um filhote de gorila no mercado negro pode valer US$ 40 mil. Além disso, a situação de pobreza, carência e falta de informação incentiva a população carente que vive nas proximidades a transformá-los em alimento. Outro problema é o avanço das mineradoras, madeireiras e carvoarias no habitat natural dos gorilas para construção de estradas.
A boa notícia é que segundo as autoridades locais, a população de gorilas aumentou nos últimos anos em consequência do desenvolvimento e aumento do turismo nas áreas protegidas. A aventura na trilha para encontrar os gorilas é cara, custa 500 dólares por pessoa. O dinheiro é usado para preservação da floresta, da espécie e também para projetos sociais com a comunidade local. Tudo é muito bem organizado, mas a trilha é bastante imprevisível.
O Histórias pelo Mundo foi até o sul da Uganda, no Bwindi Impenetrable National Park, para fazer a trilha dos gorilas. É preciso ter uma permissão especial do governo para acessar o parque e fazer a trilha. Chegando lá, fomos alertados sobre alguns pontos relevantes. A trilha pode levar de 1 à 9 horas para encontrar os gorilas, uma vez que eles se movem rápido e estão espalhados pela floresta. Não é permitida a entrada de pessoas com algum tipo de doença porque pode contaminar os gorilas. É preciso estar preparado fisicamente, pois são gorilas-da-montanha, isso significa que a trilha é repleta de subidas e descidas íngremes.
Como não se sabe quanto tempo pode levar a aventura, é aconselhável levar no mínimo 3 litros de água por pessoa e também um lanche e alimentos leves. Além de capa de chuva, repelente e, claro, a máquina fotográfica. Só que para carregar tudo isso em uma trilha que pode ser bastante longa, não seria nada fácil se não fosse uma ideia muito bacana para ajudar a comunidade local.
Você pode contratar um carregador para levar sua mochila, por cerca de 15 ou 20 dólares. São moradores da região, que estão habituados a andar na selva e fazem disto sua fonte de renda. Dessa forma, a população da região se vê estimulada a preservar os gorilas, em vez de caçá-los para servirem de refeição.
Ainda, há casos de pessoas que não aguentam a trilha depois de muitas horas de percurso e contratam pessoas para literalmente carregá-las no colo. Já esse “serviço” pode custar cerca de 500 dólares.
A trilha começa às 7h da manhã, em grupos de 8 a 10 pessoas. Cada grupo tem um ponto de início e faz um percurso diferente pela selva adentro. Todos os grupos têm o seu guia e mais 2 guardas florestais ou “rangers” (como eles chamam) para garantir a segurança do grupo pela floresta. Além disso, há rastreadores (ou “trackers”) que vão na frente de cada grupo e que se comunicam por rádio para passarem as coordenadas de qual caminho percorrer na busca aos gorilas.
Início da jornada pela selva
Depois de todo esse briefing com orientações, eu diria um pouco assustadoras, iniciamos nossa jornada pela selva. Logo de cara, uma super subida na montanha. Quando estávamos na metade da montanha, recebemos a melhor notícia de todas: os gorilas estariam ali no topo da montanha. E não fazia nem 1 hora que estávamos na floresta! Ouvir isso foi quase como uma injeção de energia para chegar ao topo.
Quando há indícios que os gorilas estão próximos, é preciso deixar as mochilas, água e demais apetrechos com os carregadores e seguir o caminho carregando apenas a máquina fotográfica. Isso é para não chamar a atenção dos gorilas com comidas e coisas do tipo, pode não ser seguro.
Andamos mais alguns metros e lá estava uma família inteira de gorilas em cima das árvores.
Embora alguns filmes e histórias em quadrinhos mostrem os gorilas como monstros ferozes, eles na verdade aceitam pacificamente a presença de humanos entre eles. O macho estava comendo frutinhas no topo da árvore, a fêmea descansando em um dos galhos, e um gorila bebê passeando de galho em galho. Ficamos mais de 1 hora observando o comportamento deles, até sermos surpreendidos com uma fêmea grávida passando a menos de 5 metros de distância de nosso grupo. Nisso, o gorila macho grande e imponente (o “silver back”) desceu da árvore, como se quisesse nos cumprimentar e dizer “quem manda aqui sou eu!”.
Tivemos muita sorte em tê-los encontrado tão rapidamente e fomos o primeiro grupo a retornar ao ponto de partida. Observá-los assim tão de perto dentro de seu habitat natural foi uma das experiências mais incríveis que já vivenciamos.”
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