Carnaíba, na região do Sertão do Pajeú, em Pernambuco, se tornou município somente em 1953. Até meados do século 19, o povoado, que nasceu no entorno da Fazenda Lagoa da Barroca, em 1823, era um dos muitos territórios dominados por indígenas cariris e, com a chegada de europeus e escravizados africanos, viu a atividade econômica florescer. Essa expansão também está associada a ocupação de terras devolutas por africanos rebelados que ergueram assentamentos baseados na resistência cultural e na produção agrícola. Um dos mais conhecidos é o Quilombo Travessão do Caroá cuja atividade principal gira em torno da agricultura e do beneficiamento da mandioca, nas casas de farinha.
Foi a partir de um olhar para as questões do entorno que duas jovens moradoras do assentamento, Ângela Rafaela e Beatriz Vitória de Assis, alunas da Escola Técnica Estadual Professor Paulo Freire, decidiram colocar a ciência e a tecnologia em prol da comunidade. O resultado foi o Filtropinha, filtro usado na purificação da água residual da produção da farinha de mandioca, desenvolvido em parceria com outros dois alunos: Eduardo da Silva Oliveira e Luana Noêmia da Silva, sob a supervisão dos professores Gustavo Santos e Carla Robecia, o grande vencedor da 11ª edição do Solve For Tomorrow Brasil , iniciativa promovida pela Samsung América Latina.
O prêmio, entregue em cerimônia realizada em São Paulo, no início do mês, teve um impacto imediato na escola. “Esses jovens se tornaram o orgulho dos pais e uma inspiração para os demais alunos”, destaca Gustavo, que acompanhou os alunos nesta jornada. Ele conta que a participação em prêmios de alcance nacional foi uma das formas encontradas para ampliar o interesse dos jovens da região pelo ensino técnico. “A escola já esteve na iminência de fechar as portas por falta de alunos”, diz. “Havia um entendimento de que o ensino técnico limitaria o horizonte ao mercado de trabalho de nível médio, deixando-os menos competitivos caso quisessem prestar o vestibular”.
Pelo visto, essa estratégia, que começou a ser desenhada um pouco antes da pandemia de COVID-19, alcançou os resultados esperados. Isso porque, o destaque na imprensa e o reconhecimento do governo estadual ampliaram o interesse da comunidade em relação aos cursos da ETE Professor Paulo Freire. Prova disso é que além do Filtropinha outros seis projetos concorreram na edição 2024 do Solve for Tomorrow. O que demonstra que a ciência está sendo encarada com outros olhos pelos jovens e suas famílias: “Dos 20 alunos que atuam nos laboratórios, 17 recebem bolsas do CNPq ou da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe)”.
Inovação pedagógica
Neste percurso, o programa da Samsung colaborou sobremaneira. Primeiro pelo formato que privilegia o desenvolvimento de soluções baseadas em ações para o desenvolvimento comunitário, a partir de insumos locais. Segundo, pelo caráter inclusivo ao ser direcionado apenas para a rede pública. “Consideramos importante reconhecer o valor dos professores que, mesmo sem grandes recursos, desenvolvem tecnologias e práticas pedagógicas inovadoras”, diz Helvio Kanamaru, diretor de ESG e cidadania corporativa da Samsung América Latina.
O executivo destaca o engajamento das unidades educacionais situadas em cidades de médio e pequeno portes, em todos os estados da federação. A lista de finalistas deste ano, por exemplo, contempla desde jovens moradores em Manacapuru (AM) e Serrinha (BA), passando por Magé (RJ) e Franco da Rocha (SP). (veja a relação completa no final do texto). Desde seu lançamento, em 2014, o programa já envolveu 179 mil estudantes e 39 mil professores de 7,5 mil escolas públicas.
Apesar da longevidade, a iniciativa conseguiu preservar o frescor do começo e se manter como um objeto do desejo de estudantes e professores. Essa percepção é confirmada pelo crescimento no número de inscrições de professores e alunos (em 42% e 10%, respectivamente) em relação à edição 2023, além do avanço de 22% no total de escolas participantes. E no que depender da ETE Professor Paulo Freire, a tendência seguirá em alta: “Esse prêmio mobilizou alunos e professores da escola que estão planejando estratégias para montar projetos para a próxima edição”, diz o professor Gustavo.
OS DESTAQUES DA 11ª EDIÇÃO DO SOLVE FOR TOMORROW
Vencedores por categoria
Nacional:
1º lugar ‘Filtropinha: dos Resíduos aos Recursos’, da Escola Técnica Estadual Professor Paulo Freire, no munícipio Carnaíba, Pernambuco;
2º lugar ‘H.E.R – Hand Exoesqueleton for Rehabilitation’;
3º lugar ‘E-Vision: Transformando a Educação com Tecnologia Inclusiva’, dos Estados de São Paulo e Ceará, respectivamente.
Júri Popular:
‘InfoLadies – Sustentabilidade e Nanotecnologia’, desenvolvido pelos alunos da Escola Estadual Professor Sebastião de Oliveira Rocha, em São Carlos (SP);
‘Biocimento: blocos de papel para pavimentação intertravada de calçadas’*, da Escola Estadual Centro Territorial de Educação Profissional do Sisal, em Serrinha (BA);
‘Pharmakos’*, da Escola Técnica Estadual (ETEC) Coronel Fernando Febeliano da Costa, em Piracicaba (SP).
CONHEÇA OS 10 PROJETOS FINALISTAS
H.E.R – Hand Exoesqueleton for Rehabilitation
E.E Profa. Iraci Sartori Vieira da Silva - Franco da Rocha, SP
Alunos do 3º ano do ensino médio da rede pública criaram uma mão robótica na impressora 3D, voltado para a reabilitação de pessoas com dificuldades motoras ou para a ampliação da mobilidade em indivíduos com baixa funcionalidade nas mãos. O projeto H.E.R é composto por motores e sensores, e foi desenvolvido a partir das habilidades de programação dos alunos envolvidos para realizar movimentos específicos, como abrir, fechar, subir e descer, além de segurar e mover objetos de até 5kg.
InfoLadies – Sustentabilidade e Nanotecnologia (Escola Estadual Professor Sebastião de Oliveira Rocha - São Carlos, SP)
Alunas do 3º ano do ensino médio da rede pública produziram uma tinta sustentável, a partir do reaproveitamento do isopor, diluindo-o em óleos essenciais, contribuindo para a solução de um problema ambiental: a não decomposição do isopor e o descarte incorreto. O grupo, formado exclusivamente por meninas, descobriu que o isopor pode ser dissolvido em óleo essencial de laranja, uma alternativa mais sustentável para o descarte desse plástico. Um dos diferenciais do projeto é o preço acessível e a sustentabilidade. A tinta desenvolvida custa 100 vezes menos do que a disponível no mercado.
Jaci Indicador da Saúde da Mulher (Escola Nossa Senhora de Nazaré - Manacapuru, AM)
Alunas do 1º ano do ensino médio da rede pública criaram projeto que busca atenuar os impactos negativos causados em mulheres que desconhecem ou têm pouco conhecimento sobre Dignidade Menstrual, por meio de histórias em quadrinhos criada pela equipe e veiculada via aplicativo. Além do material didático em forma de revista em quadrinhos, as idealizadoras criaram um absorvente higiênico inteligente capaz de identificar anomalias na menstruação. O protótipo conta com um sistema de fita com indicadores coloridos e cada cor pode indicar ou não anormalidade no fluxo menstrual. A embalagem do absorvente contém um QR Code com mais informações que podem ser acessadas pelo celular.
Plane M’s 441: Monitoramento e Mapeamento Inteligente de Riscos Urbanos (CIEP 441 Mané Garrincha – ETEC - Magé, RJ)
Alunos do 2º ano do ensino médio da rede pública desenvolveram protótipo que tem como objetivo monitorar e mapear áreas de risco de enchentes e deslizamentos, utilizando o aeromodelo FMS 1280, equipado com sensores ambientais para a coleta de dados. O objetivo principal do projeto é identificar e mapear de forma inteligente os riscos urbanos que a comunidade enfrenta, além de melhorar a qualidade de vida da população. Ao identificar os perigos existentes é possível tomar medidas preventivas e evitar situações de risco.
Pharmakos (Escola Técnica Estadual Coronel Fernando Febeliano da Costa - Piracicaba, SP)
Alunas do 3º ano do ensino médio da rede pública criaram protótipo que funciona como um dispensador inteligente de medicamentos, liberando os comprimidos nos horários e doses programadas. Através de tecnologia embarcada e um sistema inteligente de divisão de comprimidos, o dispositivo é capaz de dispensar diferentes medicamentos em horários variados, inclusive múltiplos comprimidos em uma mesma dose. A programação do dispositivo pode ser facilitada utilizando a receita médica do paciente.
MPB: Membrana Polimérica Biodegradável Multifuncional para Tratamento de água (EEMTI Marconi Coelho Reis - Cascavel, CE)
Alunos do 3º ano do ensino médio da rede pública criaram solução para a escassez e a poluição da água. Por meio de uma rota biotecnológica foi desenvolvida uma membrana polimérica para tratamento de água de forma acessível, eficaz e sustentável para uso doméstico, comunitário e industrial em regiões que enfrentam problemas de acesso à água potável. A membrana MPB funciona como um filtro avançado, capaz de remover uma ampla variedade de contaminantes presentes na água, como pesticidas, metais pesados, microrganismos, além de corantes e outros compostos orgânicos.
Filtropinha: dos resíduos aos recursos (Escola Nacional Paulo Freire - Carnaíba, PE)
Alunos do 2º ano da rede pública de ensino desenvolveram um sistema de filtragem capaz de tratar a água contaminada por resíduos sólidos, tornando-a potável e reutilizável. Ou seja, a equipe desenvolveu um filtro de baixo custo à base de cascas da fruta-pinha com objetivo de reduzir a poluição da manipueira (também conhecida como tucupi ou água da mandioca podendo ser utilizada como adubo orgânico) e desenvolver um fertilizante de liberação lenta, visando minimizar os danos ambientais. Essa abordagem não apenas reduz o impacto ambiental, mas também gera valor a partir do que antes era considerado lixo.
Alerta de Sonolência em Motoristas utilizando visão computacional e robótica (Escola Técnica Estadual Rosa Perrone Scavone - Itatiba, SP)
Alunos do 2º ano do ensino médio da rede pública criaram dispositivo para alertar motoristas que sintam sono nas estradas. O projeto surgiu quando um dos estudantes observou uma alta quantidade de acidentes nas estradas próximas à região. O protótipo é composto por um braço robótico equipado com uma câmera na extremidade, que monitora em tempo real o rosto do motorista. Ao identificar sinais de fadiga, o sistema aciona automaticamente um alarme sonoro e luminoso.
Bio cimento: blocos de papel para pavimentação intertravada de calçadas (Centro Territorial de Educação Profissional do Sisal - Serrinha, BA)
Alunos do 1º ano do ensino médio criaram projeto inovador de utilizar blocos de papel para pavimentação intertravada de calçadas. A equipe utilizou como matéria prima o papel e fibrado coco para a produção de precasts (blocos usados para pavimentos de calçadas), substituindo a areia convencional na massa do cimento, pois a retirada de areia em grande quantidade, causam erosão no solo. O projeto pode contribuir para a melhoria da qualidade de vida nas cidades, ao oferecer uma alternativa mais ecológica e acessível para a pavimentação de calçadas.
E-Vision: Transformando a Educação Com Tecnologia Inclusiva (Escola Estadual de Educação Profissional Prof. Francisco A. de Sousa - Itaitinga, CE)
Alunos de rede pública de ensino desenvolveram óculos inteligentes com visão computacional para auxiliar estudantes com deficiência visual. O projeto permite a leitura de materiais impressos, descrição de ambientes e informações em tempo real, proporcionando maior autonomia e inclusão. A ideia nasceu da necessidade de um ex-aluno com dificuldades em relação aos materiais pedagógicos, devido à uma deficiência visual, o que os fez pensar em uma solução que possibilite a leitura de ambientes, para que esses alunos se envolvam nas atividades práticas em sala de aula sem depender de um colega para compartilhar o que está acontecendo.
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