A Natura é conhecida pelo pioneirismo no uso de ativos da natureza na fabricação de seus cosméticos. Mais recentemente, seus fundadores Guilherme Leal e Antonio Luiz Seabra se lançaram de cabeça no trabalho de promoção da filosofia de Empresa B (B Corp), no Brasil. Trata-se de um conceito que coloca os possíveis impactos socioambientais causados pela atividade empresarial no centro das decisões. Em todos os níveis. Pois a Natura também acabou sendo a primeira companhia de capital aberto da América Latina a obter essa certificação, em 2014. Neste ano, dobrou a aposta ao credenciar todas as demais operações no continente, e também na Austrália, onde controla, desde 2012, a rede Aesop de cosméticos de luxo, cujo preço chega a R$ 700.
“Agora, toda vez que uma revendedora fizer uma compra de produto no site, ela receberá um extrato com todos os impactos positivos no campo social e econômico gerados pelo produto”, disse o eufórico João Paulo Ferreira, presidente da Natura, na abertura do Diálogos sobre a Nova Economia. O evento foi realizado na Casa Musical Natura, em Pinheiros, bairro de classe média alta da Zona Oeste de São Paulo. A estrela do encontro foi o magnata britânico Sir Richard Branson, dono do Grupo Virgin.
Nos cerca de 20 minutos em que participou de um talk show ancorado pela vice-presidente de marketing Andrea Alvares, e do qual participou seu amigo Guilherme Leal, Branson falou de sua preocupação em duas vertentes da sustentabilidade: energia e proteção das florestas tropicais. O empreendedor serial e aventureiro (ele já deu a volta ao mundo num balão se prepara para lançar um serviços de voos ao espaço) também alfinetou o presidente americano Donald Trump. “Os Estados Unidos estão caminhando na direção contrária dos países em desenvolvimento, no que se refere à sustentabilidade”, disse. “Parece uma política de vingança contra quem pensa diferente”.
Para o dono da Virgin, não existem justificativas técnicas ou econômicas para barrar a substituição da queima do carvão mineral, como fonte energética, pela energia fotovoltaica. “O preço está bastante competitivo”, destacou. Além disso, defendeu medidas simples, como a mudança na sistemática de cobrança de tributos, para incentivar empresas e setores sustentáveis. Bastaria que a taxação fosse proporcional ao dano causado pela atividade. “Quem polui mais e coloca em risco a saúde das pessoas tem de pagar mais”.
Leal contou que sua amizade com Branson surgiu no âmbito da Rio+20, em 2012, durante uma reunião do grupo global The Elders, formado por ex-chefes de estado (Fernando Henrique Cardoso é o único latino no grupo) e idealizado por Branson e o rock ativista Peter Gabriel. “O processo de transformação não virá apenas da ação de empresários, mas do conjunto de toda a sociedade”, afirma o sócio-fundador da Natura.
Pequenos gigantes
Mas pelo palco da casa de shows da Natura, em São Paulo, também passaram outros empreendedores brasileiros de menor porte, mas nem por isso menos gigantes quando o assunto é sustentabilidade. É o caso de Alexandre Borges, controlador da Mãe Terra, maior marca de alimentos orgânicos processados do Brasil. Aos 32 anos já é possível dizer que Borges é um veterano no setor. Começou a se interessar por comida saudável na adolescência, quando deixou a capital para morar no interior de São Paulo.
Mas o começo foi um fiasco. “Fazia umas granolas para vender para os vizinhos”, conta. “Mas boa parte da mercadoria encalhou”. Voltou ao tema depois que concluiu o curso de administração na Fundação Getúlio Vargas, de SP, e acabou convidado para um estágio na Mastercard, e Nova York. Lá, ele conheceu a Whole Foods e se encantou pela rede de varejo alimentício tida como um paraíso de comida saudável. “Fui lá pedi emprego e abri o jogo que minha ideia era conhecer o processo deles”, lembra. Acabou contratado como caixa para o período noturno, acumulando o emprego com a jornada de executivo júnior em Wall Street.
De volta ao Brasil, ele investiu em alguns negócios até chegar à Mãe Terra, na qual aplicou os conhecimentos adquiridos na rede americana e em suas jornadas de meditação num templo budista no interior do Espírito Santo. “Por meio dos ensinamentos do budismo eu comecei a refletir sobre a necessidade de abrir uma empresa com propósito”. Borges, porém, sempre manteve os pés no chão. O que rege suas tacadas empresariais é um mantra simples, mas definitivo: Não dá para ser verde quando se está no vermelho.
Para ser competitivo sem perder a essência sustentável, a Mãe Terra investiu pesado em diversas frentes: embalagens mais atraentes e qualificação de fornecedores, por exemplo, além de fechar acordos operacionais com novas redes de distribuição como o serviço de alimentação dos voos da Gol. Deu certo. “Somos os maiores compradores de alimentos orgânicos do Brasil”, garante. Mais. Se não conseguiu popularizar integralmente os produtos, ao menos fez com que os 2,5 milhões de passageiros das aeronaves da Gol pudessem provar os snacks da Mãe Terra.
Noutra dimensão e noutra escala do universo de Empresa B está a francesa Danone, que apresentou seu case por meio da vice-presidente da subsidiária da Espanha, Emmanuelle Wargon. A fabricante de produtos lácteos é uma das mais ativas no financiamento de empresas sociais. Faz isso, por exemplo, via parcerias com ativistas como o economista Muhammad Yunus, Prêmio Nobel da Paz. Estas ações começaram em Bangladesh, terra natal de Yunus, e se estenderam por outros países como o México. No entanto, as iniciativas sustentáveis não se resumem ao que acontece da “porta para fora”. A executiva aproveitou o encontro para anunciar que a subsidiária acabara de ganhar o rigoroso certificado de Empresa B.
Legenda da foto que abre esta reportagem: Adriana (Natura), Branson (Virgin) e Leal (Natura)