Os ativistas ambientais sempre se valeram de imagens fortes para chamar a atenção para as causas que defendem. Em alguns casos, a participação de celebridades é determinante para virar o jogo nos embates com empresas e governos. Foi assim, em 2017, quando dois tuítes da top model Gisela Bündchen ajudaram a fazer com que o governo Temer revogasse o decreto sobre mineração na Reserva Nacional de Cobre e Associados, mais conhecida pela sigla Renca e situada entre os estados de Amapá e Pará.
Muitas vezes, o protagonismo cabe ao integrante da espécie que se deseja proteger. Um vídeo gravado em 10 de agosto de 2015, e que mostra dois pesquisadores americanos extraindo o canudo da narina de uma tartaruga-marinha, é um bom exemplo disso. Ao longo de angustiantes oito minutos e seis segundos é nítido o sofrimento do animal. A imagem rodou o mundo e se tornou um verdadeiro libelo em relação aos efeitos nefastos do descarte irregular de lixo e a poluição dos mares. Serviu, também, para colocar o canudo de plástico na mira dos ecologistas e da população em geral.
Resultado: em menos de um ano, o outrora inocente canudinho de plástico se converteu no maior vilão ambiental do planeta! Duvida? Pois experimente solicitar o utensílio em determinados bares ou restaurantes para ver as caras de reprovação ao seu redor! “O maior inimigo das tartarugas marinhas continua sendo a pesca acidental”, diz Nina Marcovaldi, filha do casal de oceanógrafos Guy e Neca Marcovaldi, fundadores do Projeto Tamar, para uma plateia composta de jornalistas ambientais e influenciadores digitais. “Mas, em segundo lugar, vêm os plásticos de todos os tipos, incluindo os canudos”.
PARCERIA
O evento realizado na área de convivência da unidade do Tamar, situado na Praia do Forte (BA), marcou o pontapé inicial da parceria entre a ONG e a subsidiária da suíça Nestlé. A empresa não revela qual o montante que se comprometeu em repassar aos ambientalistas. Diz apenas que reservou R$ 10 milhões para investir na primeira fase de um ambicioso programa que inclui mudanças estruturais na produção do Nescau, a principal bebida láctea saborizada do Brasil. A começar pelo material usado na embalagem e no canudinho que acompanha cada uma delas.
Coube à vice-presidente de bebidas da Nestlé, Fabiana Fairbanks, apresentar as novas versões de Nescau que vêm acondicionadas em dois packs de nove unidades. Nenhuma das caixinhas traz o tradicional canudinho colado na lateral. Em vez disso, o utensílio, feito de papel, foi colocado dentro de um blister. No outro pack, o canudinho sequer está presente. Para ajudar no consumo, especialmente no caso das crianças, foi escrito na parte detrás da caixinha uma espécie de tutorial ensinando como consumir o produto sem a necessidade do utensílio.
A escolha do Nescau é estratégica. Afinal, trata-se da marca líder do segmento de lácteos saborizadas que movimenta R$ 3,8 bilhões, no Brasil, de acordo com estimativas da consultoria Euromonitor. Os suíços detêm uma fatia de 28,4%, seguidos da americana PepsiCo (a dona do Toddynho, com 19,2%) e da francesa Lactalis (dona do Choco Milk Batavo, com 9,2%).
Fabiana explica que o objetivo da Nestlé é engajar o consumidor brasileiro de diversas maneiras. Desde a área da educação até na cocriação de soluções para tornar a marca ainda mais sustentável. “Abrimos espaço para que os desenvolvedores brasileiros participem de nosso processo global de inovação aberta sobre embalagens”, conta. “As melhores ideias receberão ajuda para ganhar escala”. Os interessados devem se apressar porque a plataforma, batizada de Henri@Nestlé, ficará aberta somente até o dia 7 de abril.
SIMBOLISMO
A ação na Praia do Forte foi recheada de simbolismos. A começar pela visita guiada às dependências do Projeto. A área funciona como uma espécie de showroom das iniciativas ambientais promovidas pela ONG. No total, existem nove instalações semelhantes espalhadas pelo litoral. Apesar de ser reconhecida pela qualidade do trabalho iniciado em 1980, a entidade ainda não se tornou autossuficiente. Em geral, os patrocínios servem para bancar as atividades de preservação. Já os gastos com pesquisa são custeados, em 70%, pela venda de produtos (camisetas, cadernos e objetos de decoração, por exemplo).
Para ajudar no engajamento das populações que vivem no entorno de áreas de desova, o Tamar ajuda na estruturação de cooperativas de artesãos. “A geração de renda é importante para mostrar que a preservação da espécie pode render dividendos imediatos a uma população que, em muitos casos, vivia da caça das tartarugas e do consumo de seus ovos”, explica.
SURPRESAS AO CAIR DA TARDE
Além de funcionar como showroom de práticas ambientais, a unidade do Tamar na Praia do Forte também atua na recuperação de animais que são resgatados por pescadores ou os próprios ambientalistas. Os ovos deixados nas praias do entorno também são recolhidos e depois que ocorre a eclosão, os animais são encaminhados ao mar.
Na terça-feira 5, os jornalistas e influenciadores digitais que participaram da press trip tiveram a oportunidade de testemunhar alguns momentos especiais. O primeiro deles foi a soltura de uma tartaruga-verde, com idade entre cinco e oitos anos, que havia cumprido o estágio de 75 dias de reabilitação. De acordo com o biólogo Mazinho Santana, o animal foi encontrado na praia de Guarajuba
(distante 17 km do Tamar) quando estava se afogando porque ficou preso numa rede de pesca.
Na sequência, foi a vez de colocar no mar um lote de tartarugas-cabeçudas, que tinham acabado de nascer. Dava gosto ver o engajamento e a torcida da pequena multidão que se formou em torno da operação. Apesar de a cena ser corriqueira para os integrantes de uma instituição que possui um histórico de 40 milhões de tartarugas protegidas, parecia que estávamos diante da primeira ação do gênero. Faz sentido, afinal, os perigos à preservação da espécie, detectados pelos jovens oceanógrafos, há 40 anos, continuam existindo. “Apesar de todos os nossos esforços, as tartarugas continuam na lista de extinção”, destaca a médica veterinária Thaís Pires, responsável pela recuperação dos animais na unidade.
SAIBA MAIS
Sobre a Plataforma de Inovação Aberta da Nestlé
*O jornalista viajou para a Praia do Forte (BA) a convite da Nestlé.
Texto atualizado em 7/2/19 às 23h45min para inclusão de imagens e vídeo.