Opções que brotam no campo

Faz tempo que a diversidade das lavouras de grãos no Centro-Oeste entrou no radar de investidores globais. Especialmente das grandes trading dos Estados Unidos, da Europa e da Ásia. Afinal, para garantir o suprimento necessário para atender seus clientes pelo mundo afora, era preciso fincar raízes nos locais onde a produção acontece em maior escala e com maior produtividade.

Nos últimos anos, no entanto, estas empresas começaram a apostar na diversificação de seu portfólio. Por conta disso, além de plantarem e comercializarem os grãos adquiridos de terceiros, passaram a investir no processamento, como forma de criar uma cadeia de valor. Agora, as atenções se voltam, também, para a bioenergia.

E alguns projetos já despertam a atenção por sua opulência e também pelo apetite dos envolvidos na empreitada.

É o caso da americana ADM, acrônimo de Archer Daniels Midland Company. É dela a maior unidade de processamento de biodiesel do Brasil, situada em Rondonópolis, cidade do Mato Grosso que está no epicentro de uma das maiores áreas de cultivo de soja do planeta. A fábrica consumiu investimentos de US$ 35 milhões. E a gigante americana não pretende parar por aí.

Em meados de 2014, Valmor Schaffer, presidente da ADM para a América do Sul, se reuniu com o governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), para debater a construção de uma processadora de óleo de palma naquele Estado. A unidade surge em meio a outros projetos semelhantes na região e que têm como mote a produção de biodiesel de óleo de palma (mais conhecido como óleo de dendê), orçado em R$ 576 milhões e sob o comando da Petrobras Biocombustíveis e da subsidiária da petroleira GALP, de Portugal. “O biodiesel é um componente importante para atender a demanda por combustíveis renováveis”, diz Schaffer.

Fim da entressafra no etanol?

Outra que busca otimizar seus investimentos no campo é a também americana Cargill. Veterana na área de grãos, a empresa começou a atuar com biocombustíveis em 2006, quando assumiu o controle da Cevasa, usina de cana de açúcar instalada na cidade Patrocínio Paulista (SP). Agora, aposta no milho como matéria prima para o etanol. Para fazer isso, está investindo R$ 160 milhões em parceria com o grupo USJ. A meta é que a partir de janeiro de 2016 a SJC Bionergia, baseada em Quirinópolis (GO), se torne a primeira do país a produzir etanol durante todo o ano. Hoje, as usinas que só atuam com cana ficam paradas entre dezembro e março, período de entressafra.

A ambição da dupla Cargill-USJ não é pequena, de acordo com reportagem publicada no jornal Valor Econômico, no dia 7 de março. Já nos primeiros 12 meses de operação a expectativa é que o milho seja responsável pela produção de 80 milhões de litros de etanol. Trata-se de um volume equivalente à metade da capacidade atual da unidade.

Assim como o óleo de palma, o uso de milho na fabricação de combustíveis é cercado de polêmica. No primeiro caso, existe um fortíssimo lobby de ambientalistas decorrente do avanço das plantações de palma sobre as florestas tropicais da Indonésia e da Tailândia. Sem contar os problemas relacionados às questões fundiária e trabalhista.

No caso do Brasil, pode-se acrescentar outro componente sensível nesta mistura. A disputa no uso da terra para a produção de alimentos versus o plantio de oleoginosas e gramíneas como base de fabricação de biocombustíveis. Esta questão, de acordo com ambientalistas, precisa ser analisada com o devido cuidado. “Reconhecemos a importância dos biocombustíveis para a descarbonização da matriz energética, especialmente no setor de transportes”, afirma Ricardo Baitelo, coordenador da campanha de Clima e Energia do Greenpeace. “Mas é bom deixar claro que reprovamos a produção insustentável, como acontece em diversos países.”

Assim como os empresários e especialistas ouvidos para esta série de reportagens, Baitelo se mostra animado com as perspectivas de que o biocombustível também ajude na luta contra as mudanças climáticas. Neste contexto, a tecnologia terá um papel chave. “Torna-se essencial que aumentemos a produtividade na cultura de matérias primas e mehoremos a eficiência energética dos motores que utilizam esses combustíveis.”

AS NECESSIDADES HUMANAS POR ALIMENTO E POR ENERGIA ESTÃO INTERCONECTADAS

A seguir os principais trechos da entrevista concedida à 1 Papo Reto, por Valmor Schaffer, presidente da ADM para a América do Sul, na qual ele fala da estratégia da empresa para a área de biocombustíveis no Brasil:

Qual foi a principal motivação para a empresa apostar no biodiesel, no Brasil?

Trata-se de um componente muito importante para atender a demanda do país por combustíveis renováveis. Apesar do contexto atual, o biodiesel continua sendo um componente cada vez mais importante no agronegócio brasileiro. Tudo isso vai ao encontro da missão da ADM, que é conectar as colheitas aos lares, transformando plantações em produtos que atendam as necessidades vitais por alimentos e energia.

Em 2014, o sr. se reuniu com o governador do Pará, Simão Jatene (PSDB). Na agenda, a construção de uma processadora de óleo de palma e de um porto. Como a questão socioambiental está sendo tratada no investimento programado para o Pará?

Sustentabilidade é uma de nossas prioridades corporativas, e na cadeia da palma não é diferente. Além de seguir as diretrizes governamentais, estudos prévios de impactos sociais e ambientais foram realizados para a implementação do projeto antes do plantio. Como membro da RSPO (Roundtable on Sustainable Palm Oil), a ADM está comprometida em seguir as diretrizes em seu projeto no Pará. Os principais pontos do RSPO são: plantar em áreas que não possuam vegetação nativa primária (florestas) ou com alto valor de conservação; áreas que não estejam em disputas fundiárias e obter o prévio consentimento dos pequenos produtores.

Qual é a importância estratégica do biodiesel dentro do portfólio e também do faturamento da ADM. Não existe o temor de que o biodiesel seja vítima da mesma política errática que afetou o etanol?

A ADM é otimista em relação ao crescimento do mercado. Tanto é que operamos no Brasil a maior fábrica de biodiesel do País, com capacidade de processamento de 1,2 mil toneladas por dia. Também possuímos uma fábrica de biodiesel em Joaçaba (SC), na qual a capacidade é de 500 toneladas por dia.

Em termos globais, os biocombustíveis são vistos com certo ceticismo e até desprezo por parte de alguns ecologistas, que apontam a concorrência com a produção de alimentos. Como a ADM analisa esta questão?

O biodiesel tende a crescer em importância, mas a cadeia de alimentos em geral continuará crescendo. As necessidades humanas por alimento e energia estão interconectadas. Este não é um cenário ou/ou. Países que precisam de alimento frequentemente também precisam de energia. As melhores soluções virão de uma visão holística dessas necessidades, não de seu tratamento como interesses conflitantes.

O biodiesel em um país como o Brasil é viável do ponto de vista de custo, mesmo que a cotação do petróleo abaixo de US$ 80?

O Brasil importou, em janeiro deste ano, 770 milhões de litros de diesel fóssil, volume inferior à média mensal de 2014, que foi de 960 milhões de litros. Parte dessa redução ocorreu pela vigência do B7, que substitui parcela do diesel importado pelo biocombustível doméstico. Com alta do preço do diesel fóssil, o mercado de biodiesel tende a ser incentivado. Vale destacar que o consumo de biodiesel no mercado brasileiro cresceu 15% no ano passado e atingiu mais de 3,27 bilhões de litros, por meio da mistura compulsória ao diesel.

Quanto que a empresa já investiu em biodiesel no mundo e no Brasil?

Por política da empresa, não abrimos esta informação.

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