Mariana, uma, duas ou várias tragédias

A tragédia em Mariana, Minas Gerais, encerra uma lição claríssima: o desenvolvimento sustentável, cada vez mais, é imperativo em nossas atividades humanas. Sejam elas de qualquer natureza. O que aconteceu não foi um acidente, pois quando uma empresa trabalha com ativos ambientais, ela deve ter uma responsabilidade objetiva, do ponto de vista legal.

Essa é a lei ambiental em vigor no Brasil, responsabilizar com objetividade os poluidores, mas não quer dizer que seja executada.  Agora, para saber a extensão da responsabilidade objetiva, há que se ter transparência sobre a qualidade do dano.

Com o mar de lama que começou no dia 5/11, com o rompimento da barragem de Fundão, veio um tsunami de informações desencontradas. A primeira era de que tinham sido rompidas duas barragens, de Fundão e Santarém – sabemos agora que foi apenas a primeira. Depois, veio uma nota divulgada pela empresa Samarco (controlada pelas acionistas Vale e pela anglo-australiana BHP Bilitton) afirmando não se tratar de lama tóxica.

Porém, ao que parece o Rio Doce está morto e não se sabe sequer se é seguro cavar poços artesianos, como já estão fazendo em algumas cidades que captavam sua água – dependendo dos metais encontrados na lama, podem contaminar o solo e inviabilizar a água para consumo ou para plantio. Sabemos pouco.

Para o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que acompanha há décadas casos como este, o desencontro nas informações é um dos principais problemas. Alexsandra Maranho, da coordenação estadual do Movimento em Minas, está em Mariana para ouvir as reivindicações do povo. Segundo ela, todos estão abalados psicologicamente e com medo que volte a romper uma das barragens. Ela diz que tanto a empresa como a prefeitura de Mariana “pressionam para acordos individuais”.

Alexsandra esteve reunida com a presidente Dilma, o governador de Minas, Fernando Pimentel, o arcebispo de Mariana, Dom Geraldo, entre outros, na semana passada (veja foto). Ela lembrou que, no rompimento de Miraí, em Minas Gerais, nem todos os acordos foram cumpridos pela mineradora. “Alguns não receberam casas e não foram reassentados até hoje.”

Lentidão e burocracia 

O governo federal demorou mais de dez dias para reunir um tal comitê de gestão da crise, com representantes da Casa Civil, Meio Ambiente, Integração Nacional, Minas e Energia, Justiça, Defesa, Cultura e Advocacia-Geral da União. O primeiro encontro foi na última segunda-feira, 16/11. A presidente da República, Dilma Rousseff, também custou a visitar a área atingida. Ao menos rapidamente decretou a possibilidade de redirecionar recursos do FGTS para os atingidos.

Na mídia, vemos pequenas autoridades falando o tempo todo: prefeitos de cidades, membros de associações de pescadores, alguns cientistas, geólogos, biólogos, pessoal de órgãos licenciadores. Os grandes não querem falar, não dão entrevista.

Aliás, uma dessas entrevistas foi um bom exemplar do que é o modelo de desenvolvimento do nosso País. O prefeito de Mariana, em ato de sinceridade extrema, afirmou que, sem mineração, a cidade vai “fechar as portas”. Duarte Junior diz que 4 mil pessoas vão perder seus empregos. Curiosa conta a do alcaide, a quem resta perguntar: e os que perderam vidas? E o ecossistema morto, sabe-se lá por quantos anos? E o abastecimento de milhares de pessoas?

Alexsandra não chega a endossar o prefeito, mas consegue entender sua declaração. “É complicado, muita gente depende disso lá”, afirma.”Mas a gente questiona a forma como o processo acontece”, conclui.