Por Sergio Cross
O mais escandaloso – devido ao alto custo de construção – estádio da Copa do Mundo de Futebol 2014, o Mané Garrincha ou Estádio Nacional, situado em Brasília, acaba de ser interditado pela ‘justiça’ desportiva (STJD) devido às agressões mútuas entre “torcedores” do Palmeiras e do Flamengo em jogo no domingo, 5 de junho, assim como em razão dos impactos da reação policial, talvez não capacitada suficientemente para lidar com os arruaceiros: ao soltar bombas e gás de pimenta, os agentes da lei intoxicaram crianças, jovens, idosos e até mesmo os astros do espetáculo esportivo, os jogadores.
O goleiro do Palmeiras, Fernando Prass, por exemplo, chegou a vomitar em campo devido aos gases que inalou. Outros demonstraram claramente os efeitos nocivos dos gases nos olhos e no processo de respiração.
Além da alegada ‘insegurança’, a tal justiça esportiva pode estar motivada por interesses disfarçados de quem não quer que jogos desses times de 1ª divisão sejam disputados fora de seus estados, de modo a assegurar a renda para o seu quintal, mesmo que em valores menores. O Flamengo, por exemplo, costuma mandar jogos em cidades do interior do Rio de Janeiro, em estádios com capacidade de público bem inferior ao Mané, em Brasília.
Curioso que em maio o estádio do Morumbi (SP) teve um caso de desabamento da grade do anel inferior causando a queda de torcedores no fosso; foi algo talvez até mais grave do que uma briga de gangues, e nem por isso aquela arena foi interditada pelo glorioso e justo STJD. Com São Paulo ‘eles’ não mexem – é a força política também fazendo sombra ao esporte.
O Mané Garrincha foi considerado um dos estádios mais seguros à época da Copa; em apenas 9 minutos é possível esvaziá-lo em caso de necessidade. Foi concebido para harmonizar a convivência do público, tanto que não há muitas barreiras entre as variadas categorias de assento e há setores que permitem a livre circulação dos torcedores – lembra estádios do chamado primeiro mundo, que tive a oportunidade de conhecer, como na Alemanha. Desde o primeiro jogo que assisti no Mané, a impressão que tive é de estar em um dos três estádios alemães onde assisti partidas da Seleção (hoje Selecinha) Brasileira de Futebol.
Não sou daqueles torcedores fanáticos; torço de longe para o Ferroviário Atlético Ituano, campeão paulista há pouco tempo. Quase não vou a estádios, mas sempre que fui ao Mané me senti seguro, convivendo com torcedores de times adversários lado a lado, numa boa. Quem foi ao Mané assistir Flamengo x Palmeiras relata que, até a briga, estava rolando uma festa bonita, com torcedores dos dois times misturados ao longo do estádio. Separados estavam apenas os ‘FDPs’ das organizadas.
A opinião pública em Brasília está inconformada porque já tem que arcar com os custos de manutenção desse elefante branco construído no governo anterior local (comandado pela dupla PT-PMDB) a um custo de quase R$ 2 bilhões e agora nem pode mais arrecadar alguns R$ ao sediar jogos de 1ª divisão sabe-se lá por quanto tempo por causa dos arruaceiros.
O sinal está bem claro nas rodadas de conversas na cidade: muitos já declararam que não vão mais ao estádio e os que ainda querem ir, não vão mais levar seus familiares. As novas gerações que tiveram a péssima experiência do clima de guerrilha no Mané no jogo Flamengo e Palmeiras talvez fiquem traumatizadas pelo fato e não desenvolvam o bom hábito de assistir a jogos esportivos ao vivo.
Quem vai pagar esta conta, tanto financeira quanto moral?
Ah! E ainda tem outras despesas: tem a conta do hospital público que recebe, trata e medica os feridos nesses confrontos e quando são internados (como é o caso de um dos brigões, desde o dia 5/6) ocupam leitos que poderiam ser destinados a cidadãos honestos e civilizados que eventualmente precisam de cuidados médicos; tem ainda a conta do ‘uso’ do aparato policial, tanto militar quanto civil (delegacias), para dar andamento às detenções, prisões, inquéritos etc. etc. Portanto, esses canalhas geram um rol de problemas e despesas que são bancados pelo suado dinheiro que pagamos com impostos e taxas.
O fato é que não há mais espaço para essa corja nos espaços públicos da capital federal ou em outras localidades.
No passado recente do Mané Garrincha houve casos de muita confusão entre ‘torcedores’ brigões em alguns jogos, a maioria de times de fora do DF.
Ou seja, os outros estados da nossa querida Federação, além de enviarem para Brasília seus políticos de caráter e ética duvidosos, agora enviam as “torcidas” organizadas, verdadeiras quadrilhas compostas por gente desocupada, agitadores profissionais, assassinos travestidos de torcedores – lembram do Kevin Espada na Bolívia? Mas é preciso registrar que o DF tem seus próprios arruaceiros – assim como políticos sujos – que se passam por torcedores. São de times de divisões inferiores, como Gama e Brasiliense, cujos enfrentamentos são registrados nas delegacias e na imprensa local.
Reação social
Conviver harmoniosamente em um estádio, mesmo que isso envolva torcedores de times adversários, é sinônimo de civilidade; de sustentabilidade, classificaria com tranquilidade. Quando se vê que há grupos que vivem em outra ‘vibe‘, a da violência nua e crua neste caso dos selvagens uniformizados, isso denota que o brasileiro está longe de reconhecer no próximo o necessário respeito que este merece, ainda que discorde de nós em termos de times de futebol.
Essa galera brigona tem que encontrar outras formas de extravasar sua violência sem envolver inocentes nisso. A legislação atual, infelizmente, não faz frente a fatos como esse. Os safados que vieram a Brasília estão livres, leves e soltos. Ser fichado na polícia, para eles, é título honorífico. A sociedade brasileira precisa reagir.
“Evite ir a jogos de futebol no Mané Garrincha!” Este, definitivamente, não é o conselho que gostaríamos de dar aos habitantes e aos visitantes da capital.
ATUALIZAÇÃO: A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) manteve o jogo FluminenseXCorinthians, marcado para o dia 16, no Mané Garrincha.