Quitanda móvel e sustentável

Quem caminha pela rua Coronel Melo de Oliveira, na Pompeia, consegue perceber nitidamente as mudanças urbanísticas que afetam boa parte da paisagem de São Paulo, exposta à especulação imobiliária. Os sobrados do outrora bairro operário começam a conviver com megaprédios, dotados de megavarandas gourmets e mega áreas de lazer. Tudo para manter as pessoas seguras, felizes e trancadas dentro do condomínio.

Mas o bairro, em geral, e a rua, em particular, ainda reservam boas surpresas. Uma delas é a grande quantidade de árvores nas calçadas, que emprestam um ar bucólico à paisagem, além de garantir um frescor nos dias de calor.

Contudo, é no número 1.121 que fica a mais nova surpresa do pedaço. Trata-se da Quitanda da Komborgânica, onde é possível beber um suco natural e degustar um sanduíche ou bolo, feitos com ingredientes naturais. E, claro, abastecer a dispensa e a geladeira com frutas, verduras, vegetais, produtos lácteos, compotas e antepastos produzidos com ingredientes naturais por pequenos empreendedores.

A Quitanda é a segunda fase de um projeto de vida e uma tacada empreendedora comandada pela jornalista Joana Ricci e o agrônomo Mario Júnior.

O negócio nasceu em outubro de 2015, na esteira do desejo de Joana de dar uma guinada em sua trajetória profissional. “Queria atuar em uma atividade que me trouxesse prazer, rendesse o suficiente para pagar as contas e ajudasse a melhorar a vida das pessoas”, conta ela. Neste processo, pesou também o nascimento de sua filha. A Kombi estilizada faz paradas fixas de terça-feira a sábado em empresas e condomínios residenciais, onde comercializa verduras, frutas e vegetais.

Ela conta que a decisão de apostar em um ponto fixo surgiu como obra do acaso. A princípio, os sócios estavam em busca de um depósito no qual pudessem ampliar o volume de produtos adquiridos semanalmente. “Ao nos depararmos com o Caza Mais nós ficamos encantados e decidimos alugar o espaço”, explica.

Isso não significa dizer que as viagens da Nica, como a Kombi adaptada é chamada carinhosamente, chegaram ao fim. “São negócios complementares”, justifica Joana. “Aqui podemos vender mudas de tempero para horta doméstica e produtos lácteos que necessitem de refrigeração constante.”

Mais. As mercadorias não comercializadas no roteiro da Nica, que inclui empresas e condomínios residenciais, servirão de base para a produção de sucos, doces e salgados. Na inauguração oficial da Quitanda, ocorrida no sábado 29/10, ficou evidente que a Komborgânica é a grande vitrine de um espaço bastante privilegiado.

Arte engajada e criativa

A começar pelo tamanho. Em 560 m², divididos em três pisos, o casal de empreendedores Frederico Furquim e Lula Del Amo, criaram um conceito de coworking diferenciado. Desde a vitrine, literalmente ocupada pela Quitanda, até o mezanino, que servirá para desfiles de moda, cursos e palestras. “Quisemos unir pessoas e projetos com aderência ao nosso lifestyle”, explica a publicitária Lula, que comanda o negócio em parceria com o marido.

O misto de coworking, galeria de arte, café e espaço para o desenvolvimento de projetos sociais impressiona pelo capricho. E pensar que ele nasceu a partir da desistência do comprador do imóvel, aonde funcionava a confecção pertencente a Frederico.

“Nosso objetivo era pegar os recursos para montar um espaço criativo em Barcelona”, conta ele. “Mas como não conseguimos vender o imóvel, decidimos montar a Caza Mais”, completa Lula, que deixou o emprego na Lojas Riachuelo para se tornar empreendedora.

Barcelona, contudo, permanece no roteiro do casal. Os dois espaços serão interligados do ponto de vista da pegada cultural funcionando, como projetos complementares.

Além da Komborgânica, já aderiram ao Caza Mais alguns renomados artistas urbanos e makers da área criativa. Um deles é o casal Evandro Linhares Angerami e Ju Paranaguá. Mais que apenas pintar lindos peixes que viviam nos rios escondidos pela especulação imobiliária, ele pretende usar a arte para unir paulistanos de classes sociais diferentes.

Isso será feito por meio de oficinas de grafite, nas quais os alunos mais abonados irão bancar o custo da mensalidade de alunos de escolas públicas. “A convivência harmoniosa não depende de classe social, mas dos valores que cada um possui”, filosofa.

O projeto Entrega por SP e o Projeto Lavanderia também garantiram presença. O primeiro atua na assistência às pessoas em situação de rua, enquanto o outro vai cuidar da qualificação deste contingente, a partir de cursos profissionalizantes em lavagem de roupas. A expectativa de Joana é que eles se abasteçam em sua Quitanda. Aliás, os vizinhos também. “Afinal, quem não gosta de uma comida saudável, né?!”