Roupas que contam histórias

À frente da Re-Roupa, a curitibana Gabriela Mazepa vai imprimindo um novo significado à reciclagemQuem é: Gabriela Mazepa Por que é importante: comanda um grife de moda que se tornou referência em upcycling, técnica que consiste no reaproveitamento de peça usadas Reduzir, Reutilizar e Reciclar. Os famosos três Rs, que se tornaram uma espécie de mantra nos primórdios de debate da sustentabilidade, na década de 1990, nunca foram levados muito a sério no mundo da moda. Afinal, para manter o ritmo de produção no esquema do fast fashion, que prevê a substituição das coleções num ritmo frenético, haja tecidos, corantes, botões... e muitos barris de petróleo para produzir fios sintéticos (lycra, náilon, entre outros). Mas e a tal da sustentabilidade? “A produção da forma como se dá, e no ritmo atual, não tem como ser sustentável”, critica a estilista Gabriela Mazepa, 35 anos, criadora da grife Re-Roupa, cujo nome remete à ressignificação de peças usadas que se transformam em outras novinhas em folha! O desejo de trabalhar com conceito de upcycling surgiu durante a faculdade de moda, em Paris. E acabou sendo base para que a curitibana que sonhava em ser arquiteta ganhasse um prêmio do prestigioso British Council Fashion Awards. A distinção abriu as portas do mercado europeu e rendeu um convite para trabalhar numa grande confecção no Sri Lanka. Mas a vontade de voltar ao Brasil falou mais alto. De volta ao país, Gabriela sabia que Curitiba tinha ficado pequena demais para suas ambições. Decidiu morar no Rio de Janeiro onde montou a grife que possui uma pegada socioambiental. O trabalho da estilista chamou a atenção de empresas de grande porte preocupadas com o impacto causado por sua atuação, como a carioca Farm. “Vamos produzir de 200 a 300 peças para eles a cada coleção”, conta. “Todas elas a partir do reaproveitamento de peças descartadas pela Farm”. [caption id="attachment_15183" align="alignleft" width="300"] Cartaz de divulgação da Re-Roupa, espalhado pelas ruas de SP e do Rio[/caption] Mas Gabriela, de fato, vive e enxerga a moda com outros olhos. Por isso, nunca pensou em investir pesado em sua própria grife, como fizeram outros estilistas de sua geração. Inclusive aqueles com discurso engajado na sustentabilidade do processo. “Crescer significa produzir cada vez num ritmo mais frenético, gerando maior impacto ao meio ambiente e, consequentemente, desperdício no final da cadeia”. Ela nega, no entanto, a pecha de xiita. “Estamos vivendo um momento bem crítico, no qual as pessoas querem a todo custo ser sustentáveis, nem que para isso tenham de se aproveitar de discursos mentirosos, apenas para fazer parte de um movimento”. Para pagar as contas, a criadora da Re-Roupa se apoia também em cursos em parceria com o Instituto Europeu de Design (IED), o Senac e o Sesc, nos quais passa adiante suas técnicas de upcycling. Nestas dinâmicas, vestidos se tornam camisas de homem, calças viram casacos unissex e assim por diante. Ela desenvolve, também, trabalhos para a ONG Rede Asta, fundada em 2005 e que tem como foco o empoderamento de artesãs em morros e favelas do Rio de Janeiro. Gabriela garante que nada irá desviá-la da rota que traçou para sua vida profissional. Nem mesmo o fato de estar abrindo um ponto-de-venda em São Paulo, cidade na qual vai fixar residência. Sua ambição é converter a Re-Roupa numa empresa social (ou Empresa B, no jargão americano) que opera a partir da lógica do capitalismo responsável. Mas isso ainda vai levar um tempo. “Esse olhar diferenciado das roupas, enxergando em cada peça uma história que pode ser transformada para contar outra história, sempre foi algo bastante natural para mim. Mesmo antes de ingressar na moda”, diz. “Afinal, precisamos ser parte das mudanças que queremos ver no mundo”.