O conhecimento como arma de luta

Da militância estudantil à criação de um curso de inglês com o objetivo de quebrar barreiras de acesso ao mercado de trabalhoQuem é: Rodrigo Faustino Porque é importante: criou o Ebony English curso que ensina inglês apostando na disseminação da história e dos valores da África O domínio do idioma inglês sempre foi uma barreira adicional, no mercado de trabalho, para muitos brasileiros. Especialmente os integrantes da comunidade afro-brasileira. Foi isso que o paulistano Rodrigo Faustino, 40 anos, percebeu durante sua busca por uma colocação nos processos seletivos dos quais participou, logo que ingressou no curso de técnico em processo de produção na unidade Tiradentes da Faculdade Tecnológica de São Paulo (Fatec). “Se era difícil para quem estudava na Fatec, imagina para os demais”, recorda. Foi para ajudar a preencher essa lacuna na formação de inúmeros paulistanos que ele decidiu criar o Ebony English. O curso nasceu em 2005, como uma startup abrigada na incubadora da Fatec. A iniciativa recebeu a imediata adesão do Coletivo Bronkx, composto de 10 estudantes negros. Contudo, o projeto só virou um negócio de verdade, em 2008, quando Rodrigo concluiu o curso de engenharia de produção na Universidade do Estado de São Paulo (Unesp). Ao longo dos anos, foi agregando profissionais para melhorar ainda mais a gestão do negócio. Em 2014, Marta Celestino, responsável pela área de marketing, entrou na sociedade. Um ano depois, foi a vez de Domenica Alves, que estudou na prestigiosa John Hopkins University, dos Estados Unidos, e ficou responsável pela coordenação pedagógica, o empreendedor desenhou um projeto único: ensino do idioma com viés de militância pela valorização das raízes africanas. “Nosso foco sempre foi a integração da diáspora africana nas Américas com os países da África”, conta. Para isso, além das aulas convencionais, os alunos participam de videoconferências com jovens de Gana e dos Estados Unidos. O material didático também privilegia aspectos da ancestralidade negra. Deste modo, o aprendizado do idioma deixava de ser um fim em si mesmo para se transformar em uma ferramenta de integração e aquisição de conhecimentos, além da estruturação de uma rede de contatos. Foi por meio desta dinâmica que 300 alunos aprenderam a falar inglês. Para receber o certificado, após um período que varia de 18 a 24 meses, todos têm de se habilitar em testes de proficiência: ITEP e TOEFL, reconhecidos pelas universidades americanas. “Essa foi a forma que encontrei de validar o certificado”, diz. Segundo ele, o perfil médio é composto de mulheres na faixa entre 25 e 40 anos, com diploma universitário e que enxerga na qualificação no idioma britânico uma alavanca para sua carreira. Um dado curioso: 70% dos alunos já tiveram alguma experiência prévia em cursos de idioma, mas acabaram desistindo. [caption id="attachment_15268" align="alignleft" width="300"] Turmas pequenas e material didático que reforça os valores da comunidade afro[/caption] Prestes a completar 10 anos, Rodrigo prepara uma guinada na trajetória da empresa, em duas frentes. A primeira delas é por meio da criação de filiais nas principais capitais. Até março de 2018, ele espera ter fincado a bandeira da Ebony English no Rio de Janeiro e em Salvador. Belo Horizonte e Porto Alegre também estão no roteiro. O outro foco é a ampliação do escopo de atuação de escola para uma espécie de HUB de negócios, destinado a fazer a ponte Brasil-África-Estados Unidos. “A internet está gerando inúmeras mudanças em diversos setores, especialmente no da educação. Além disso, deixamos de ser o único curso de inglês com apelo étnico e cultural”, explica. A mudança chega no momento no qual a Ebony English já atingiu o ponto de equilíbrio e está pronta para se tornar um negócio lucrativo. Para complementar a renda familiar, Rodrigo desenvolveu uma carreira paralela como consultor em TI. A ideia da rede de negócios surgiu em meios às diversas viagens internacionais, a lazer e a trabalho. A mais recente delas teve como destino a cidade colombiana de Medellín, onde participou da Afro Innova, um dos mais importantes eventos de inovação e cultura maker naquele país. “Mais do que ensinar inglês, queremos ver os nossos alunos inseridos em oportunidades de negócios onde esteja presente a filosofia ubuntu*”, define.     *N.R.: palavra de origem zulu que significa que uma pessoa só se completa por meio de outras pessoas