A utopia necessária

Já dizia o escritor francês Victor Hugo que “Não há nada como o sonho para criar o futuro. Utopia hoje, carne e osso amanhã”. E não há por que duvidar desse axioma. Afinal, foi graças aos “sonhos impossíveis” que os seres humanos desenvolveram as tecnologias que nos permitem, hoje, voar, curar doenças e desfrutar de uma condição de vida melhor. A forma de enxergar as cidades também vem assumindo uma dimensão diferente, graças às utopias e aos desafios que por vezes começam na universidade, ou mesmo na prancheta de um urbanista solitário que persegue o sonho da cidade ideal.

E o pessoal do Estúdio 41, de Curitiba, é chegado a utopias. Principalmente àquelas capazes de tornar o espaço urbano em um local cada vez mais agradável e cercado de verde. Do chão ao teto. Li-te-ral-men-te!

A partir de um concurso de projetos realizado recentemente pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), da capital paranaense, eles criaram um modelo de ocupação destinado a cobrir de verde a paisagem da região central da cidade. Só que eles optaram por um verde que, além de alimentar a alma, também garante nutrientes de qualidade para o corpo, especialmente o estômago. “Quisemos mostrar que é possível alimentar a população de forma melhor e a custos competitivos”, explica Eron Costin, um dos sócios do Estúdio 41.

O ponto de partida deste trabalho de requalificação são prédios que se tornaram símbolo do abandono de uma parte que conta muito da história da cidade e refletem o processo de abandono da região central. Algo que se repete, infelizmente, em boa parte das capitais brasileiras. Um erro, de acordo com Costin. “O centro foi escolhido por contar com uma boa infraestrutura consolidada em matéria de transportes e outros serviços públicos”, diz.

No projeto apresentado pela equipe do escritório (no qual também dão expediente os sócios Emerson Vidigal, Fabio Henrique Faria e João Gabriel Rosa), a utopia ocupa um lugar de destaque. A começar pela proposta de conversão em hortas, também dos espaços que, hoje, são usados como edifícios-garagem. “Idealizamos um futuro no qual o automóvel será dispensável ou terá uma presença reduzida.”

A parceria com o departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Paraná (UFPR) possibilitou aos nove escritórios que participaram da Chamada Pública a utilização de estagiários para fazer o trabalho de campo. Ao final, todas as propostas foram reunidas na exposição Arquitetura para Curitiba: Uma Mostra em Mutirão. A opção pela agricultura urbana, de acordo com Costin, sócio do Estúdio 41, é fruto da observação de um movimento cada vez mais global, de incentivo ao plantio de alimentos próximo ao local de consumo.

As fazendas verticais já ganharam espaço no Brooklyn, bairro descolado da cidade de Nova York, além de serem apontados como uma das vertentes de requalificação da falida Detroit, também nos Estados Unidos e considerada a capital do automóvel. E é fácil entender por quê: “Em um metro quadrado é possível produzir 25 quilos de alimentos por ano”, conta. “Um pouco menos dos 28kg/ano que é o consumo médio de hortaliças e legumes de cada brasileiro.”

Outro componente importante dessa iniciativa é a possibilidade de redução da geração de resíduos orgânicos, como sobras de alimentos, a partir de sua conversão em adubo natural. Na avaliação de Costin, mesmo que o projeto idealizado pelos utópicos do Estúdio 41 não vingue a iniciativa pode servir de inspiração para que outros sonhadores e visionários sigam esta linha.

No entanto, o escritório também vive de projetos com o “pé no chão”, mas que, nem por isso, são menos inovadores. É o caso da Nova Estação Antártica Brasileira, um dos muitos projetos bacanas no portfólio destes jovens arquitetos e urbanistas.