Cartas para o futuro

Quem sãoCarlos Pedro da Silva, Sila Vieira e Elaine Ramos
Por que são importantes: criaram a primeira franquia nascida em uma favela, destinada a prestar serviço de entrega de correspondências

Para quem mora "no asfalto", receber em casa correspondências bancárias, contas de consumo, cartas de parentes ou encomendas feitas em lojas virtuais é um ato para lá de trivial. Contudo, este componente básico do que chamamos de cidadania pode significar um verdadeiro luxo para aqueles que vivem em morros e favelas pelo Brasil afora. Foi a partir da observação desta realidade que nasceu o Projeto Carteiro Amigo, fundado por Carlos Pedro da Silva, sua mulher Elaine Ramos e o primo Sila Vieira. Todos moradores da Rocinha - comunidade encravada no bairro de São Conrado, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Hoje, a empresa fundada em 2001 ostenta o honroso título de a primeira franquia do país nascida em uma favela. A ideia é simples e consiste em uma central encarregada de receber correspondências e encomendas, para depois entregá-las ao destinatário. Em mãos. Até então, as cartas e contas de consumo eram deixadas por carteiros oficiais e funcionários de concessionárias de energia em pontos como biroscas, e cabia aos moradores correr atrás do que era seu.

"Mais do que levar cidadania às pessoas, estamos garantindo que elas participem da economia como um todo", justifica Silva. Sem endereço formal, este grupo de brasileiros acaba ficando à margem das benesses proporcionadas, por exemplo, pelas lojas virtuais nas quais os preços normalmente são mais baixos do que nas lojas físicas. "Quem tem menos recursos acaba pagando mais caro, apenas porque não possui um endereço formal." Apesar do forte componente social desta iniciativa, Silva deixa claro que eles tocam um negócio cujo objetivo é ter lucro e crescer. Muito. Para fortalecer sua vertente empresarial, eles fizeram inúmeros cursos de qualificação no Sebrae do Rio de Janeiro. A entidade também os ajudou na estruturação da microfranquia Carteiro Amigo.

No entanto, quem põe a mão na massa é o trio. Cabe a eles correr atrás de parceiros dispostos a desembolsar até R$ 32 mil. Neste valor está incluído o aluguel do imóvel, a compra de equipamentos (ar-condicionado, mesas, telefone e computadores), além do material de propaganda: folhetos e faixas. Hoje, a rede Carteiro Amigo conta com cerca de 30 mil clientes diretos, espalhados pelas oito unidades, todas no Rio. O serviço de campo é feito por 30 funcionários diretos recrutados nas comunidades atendidas. Silva diz que o retorno do investimento pode acontecer e um período que varia de seis meses a um ano. Dependendo do tipo de serviço, que se tornou bastante diversificado desde seu lançamento, há 13 anos.

É que durante o processo de formalização do negócio ficou evidente que a sacada inicial de entregar correspondências, pela qual os clientes pagam uma taxa módica, entre R$ 10 e R$ 16 por mês, não seria suficiente para garantir a longevidade da empresa. "A partir dos cursos de qualificação fomos ampliando nossos horizontes e nossa expectativa em relação ao futuro", conta. Foi aí que eles viram que a base de clientes fixos e os moradores em geral, poderia ser atrativa para outros serviços de logística e de marketing direto: entrega de folhetos e até pesquisas de campo. Esta última área, aliás, foi a responsável pelo pontapé do negócio. Em 2000, eles integraram a equipe de recenseadores do IBGE que atuou na Rocinha. "Descobri que uma das maiores necessidades dos moradores era este tipo de serviço", recorda. A partir daí, fizeram um empréstimo de R$ 500 no Viva Cred, braço de microfinanças da ONG Viva Rio, e foram à luta.