Congresso 2.0

Desde que foi fundado, fechado e reaberto o Congresso Nacional passa por crise de credibilidade perante a população brasileira. Ao longo dos tempos virou um templo da Democracia Brasileira. Mas, na verdade, na verdade encontra mais facilidade para atender aos pleitos da “sociedade organizada”, grupos ideológicos que conseguem se associar em torno de ideias, projetos e/ou interesses (sejam positivos para o conjunto da sociedade ou escusos).

Muitos chamam esses grupos sociais de “lobbies”; outros de “bancadas disso”, “bancadas daquilo”, como os evangélicos, os ruralistas, os ambientalistas etc. Os assuntos que tais grupos – falo dos mais organizados, mobilizados e influentes na opinião pública – têm interesse em ver aprovados ou bloqueados no Legislativo geralmente encontram atalhos para tramitar rapidamente pelos ilustres representantes eleitos democraticamente pelo povo brasileiro.

Naturalmente que quando as ruas se mobilizam em torno de uma ou mais causas que fogem do interesse direto dos tais grupos, e com isso conseguem boa repercussão nacional e internacional, os parlamentares correm para demonstrar apoio. Há vezes em que isso é pura cena para a plateia porque nos meandros das normas internas do Legislativo é possível distorcer promessas feitas no calor das tais manifestações, de modo a abafar eventuais prejuízos aos lobbies.

Se você acha que eu julgo negativamente a existência dos tais lobbies, errou. Acho legítimo os setores se organizarem e cobrarem providências dos representantes legais. Não dá é para concordar com quem não se organiza e só reclama, bem como com os que montam lobbies “para o mal” e agem ao arrepio da moral e da lei. Se cada segmento da sociedade se organizasse em grupos, teria maior participação e influência nas grandes discussões nacionais – e também nas pequenas. Foi a organização que levou partidos como o PT a ascender ao Poder Executivo nesses vários anos. Sem estar formalizado em grupos, ninguém chega a lugar algum democraticamente – ou não – neste país.

Mas o fato é que o Congresso Nacional se configura em um órgão gastador, um grande cabide de empregos para não concursados, um trampolim para transformar em influentes e milionários, descompromissados com o batente, gente sem preparo para desempenhar o trabalho parlamentar (qualquer mané pode ser candidato a legislador). O parlamento também deixa a desejar em relação à abertura de oportunidades iguais para os setores da sociedade apresentarem reivindicações e para que esses mesmos pleitos sejam discutidos abertamente em um cronograma previamente acertado com essa mesma sociedade.

Este trecho de uma nota publicada no site online da revista Veja dá uma boa ideia de como é farta a distribuição de dinheiro público para quem evita trabalhar duro:

“Enquanto o restante do país voltou ao trabalho na Quarta-Feira de Cinzas, os parlamentares vão descansar até o dia 24. Serão 11 dias longe do serviço.

Assim, no primeiro mês em que receberão o salário reajustado de R$ 26,7 mil para R$ 33,7 mil, os deputados terão trabalhado apenas nove dias – segundas e sextas ganharam há muito tempo o status de feriado. São R$ 3.744 por dia, fora “auxílios” para tudo e verbas suplementares.”

Em artigo anterior no Papo Reto eu já avisava que o Congresso Nacional é importante para equilibrar o exercício do poder democrático no Brasil. Tá bom que às vezes práticas como mensalão e petrolão (se você crê que existiram) e também negociação de cargos no Executivo e áreas afins (39 Ministérios, lembram?) corrompem esse equilíbrio, mas deixar tudo nas costas do Executivo seria praticamente nomear uma “ditadura democrática”.

Então, o caminho que o Congresso Nacional poderia seguir neste momento (e olha que está bem atrasado nisso…) era o de melhorar a representatividade social, reduzir sobremaneira os custos e acelerar sua produtividade. Fácil, né?

Sim, falar é fácil. Fazer é bem difícil porque isso significaria contrariar os interesses estabelecidos, a começar dos parlamentares que se beneficiam e gostam do atual sistema.

Congresso Nacional – O tamanho do monstrengo

– São 513 deputados federais e 81 senadores

– Quase 80% dos servidores da Câmara e mais da metade dos funcionários do Senado não são do quadro efetivo. Câmara afirma possuir mais de 12 mil funcionários sem concurso, quase quatro vezes mais o número de efetivos (2014).

– Congresso Nacional custa R$ 23 milhões por dia ao país ou 8,4 bilhões ao ano (2013)

– Os gastos com pagamento de pessoal lideram as despesas do Congresso. O pagamento de horas extras é outro gasto que soma uma quantia significativa nas despesas do Congresso.

– O congressista brasileiro é o segundo mais caro em um universo de 110 países – custo de 7,4 milhões de dólares por ano – segundo estudo realizado em 2012 pela Organização das Nações Unidas (ONU) em parceria com a UIP (União Interparlamentar), ficando abaixo apenas dos parlamentares americanos (custo de 9,6 milhões de dólares anuais).

– 16,1% das pessoas que trabalhavam nos gabinetes dos senadores eram filiadas a algum partido (junho de 2013).

– O ato administrativo n.º 14 da Comissão Diretora do Senado, de 22 de maio de 2013, define que até 55 cargos de confiança estão disponíveis para o gabinete de cada senador.

– O Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC) acabou oficialmente há 16 anos. Mas, a cada quatro anos, aparecem novos pensionistas. E mais: só em 2015, a renda desses políticos já subiu 26,34%. Há quem acumule aposentadorias e ganhe mais de R$ 50 mil por mês.

Fontes: Congresso em Foco, Veja, Contas Abertas, Agência Pública

O Congresso é um monstro sempre com fome de mais. Um exemplo é esta notícia divulgada na semana do Carnaval pelo site Congresso em Foco, que acompanha com lupa o que os nossos congressistas fazem e deixam de fazer.

À distância

Mesmo com as novas tecnologias que permitem comunicação à distância em tempo real, prevalece a mentalidade da presença física dos parlamentares nas instalações do monstrengo em Brasília. E dá-lhe custo com viagens, hospedagem, apartamento funcional, diárias, mordomias etc.

Os parlamentares marcam ponto em Brasília de 3a a 5a feira, mas isso não é uma regra. Poderiam exercer boa parte das tarefas, TODOS OS DIAS, se atuassem também à distância –

desde que sistemas de controle pudessem aferir a atividade de cada um. A Justiça brasileira faz audiências à distância. Por que os parlamentares não o fazem também?

Os deputados e senadores participam de reuniões, audiências e sessões nas comissões diversas do Legislativo, além das sessões nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Com a participação à distância daria até para trabalharem sábados, domingos e feriados (aí eu forcei a barra, né?). Ou, ainda, os parlamentares poderiam encontrar tempo para exercer outras atividades profissionais – como fazem seus colegas em outros países – e os salários de legisladores poderiam ser reduzidos (nova forçação…).

Os mais novos talvez não saibam, mas o pregão da Bolsa de Valores (Bovespa) era feito em São Paulo, até 2005, com a presença física dos corretores, que negociavam aos berros – uma insanidade para os leigos – os valores dos títulos diariamente. Em junho de 2009 a BM&F – então Bolsa de Mercadorias e Futuros – também encerrava os pregões presenciais. As bolsas estão juntas e as tratativas em torno dos títulos negociados ocorrem à distância, eletronicamente, com ampla segurança e controle. Por que não fazer o mesmo – ou algo similar – em relação à atuação dos parlamentares no Congresso Nacional? Eu falo da atuação séria e não dos “negócios” ok?

Muito mais produtividade e racionalização de custos seriam as consequências de uma atitude como essa, desde que bem planejada e aplicada. Seria possível reduzir, e muito, o número de funcionários, em especial dos não concursados nas instalações do Congresso em Brasília.

Não pretendo ser considerado inimigo nº 1 dos que dependem direta ou indiretamente da renda que o Congresso Nacional gira. Boa parte desses recursos movimenta a economia do Distrito Federal, porém, o tamanho da conta é bem grande e todos os brasileiros que recolhem tributos é que arcam com isso. E mais do que nunca é hora de reduzir custos da máquina pública. Alô Poder Executivo e Poder Judiciário!!! Isso vale para vocês também!

Novamente a Veja fez um cálculo de economia de custos da máquina do Senado Federal se todos os senadores adotassem apenas alguns cortes, como o faz um senador pelo Distrito Federal. O resultado seria uma economia de R$ 1,3 bilhão nos próximos oito anos com as seguintes providências: redução de funcionários nos gabinetes; de passagens aéreas; de salários extras; de despesas com plano de saúde; de auxílio-moradia; de uso de carro oficial; de auxílio-alimentação.

O “Congresso 2.0” poderia ser implantado aos poucos, de modo a suavizar os impactos nas rotinas de quem gravita em torno do monstrengo fincado em Brasília. Mas tudo muito bem planejado, discutido, licitado e bem administrado para tal iniciativa ser mais do que uma experiência, ou seja, uma prática para servir de exemplo mundial.