Por Keli Vasconcelos
O lado insustentável das cidades já conhecemos muito bem: trânsito, falta de mobilidade – e quando há, não atende a todos –, poucas áreas verdes – em especial em regiões mais distantes dos grandes centros, desigualdade. E a possibilidade de uma cidade mais igualitária, com bom transporte público para todos, viva, com mais espaço, moradia, deslocamento facilitado para trabalho/lazer/turismo, com mais qualidade de vida? Essas e outras provocações foram mote para o “Envolverde Convida”, o primeiro de uma série de debates, ocorrido na quarta-feira (14/12), com a presença da arquiteta e urbanista Ermínia Maricato, do diretor do ICLEI, Rodrigo Perpétuo e do especialista em Cidades e pesquisador do Núcleo de Estudos do Futuro, da PUC-SP, Diego Conti, com mediação do jornalista Dal Marcondes, da Agência Envolverde.
Na primeira parte do evento, Ermínia Maricato fez um panorama do mapa de urbanização da cidade de São Paulo. “Cidade é movimento. E o que vemos hoje é contrário disso”, reforçou. Ela também mostrou dados sobre os grandes deslocamentos de casa ao trabalho para uma boa parte da população que vive nos extremos da cidade, como a zona leste (adendo: esta repórter levou mais de duas horas da região até o local do evento, no Sumaré – Zona Oeste). “Infelizmente, ainda não foi dada vez e voz para essas regiões, ainda as oportunidades de trabalho concentram-se no chamado centro expandido. Quando vejo pesquisas que apontam um gasto médio de duas horas no trânsito casa-trabalho, no transporte público diário, penso muito nas mulheres chefes de família”, frisou e complementou que a questão não é a ausência de planejamento. “Temos leis muito importantes, planos exemplares e conhecimento técnico reconhecido em outros países. O que falta ainda é a valorização e reconhecimento dessa realidade que vivemos. Dar vez e voz para as pessoas que vivem nos extremos das cidades. E, principalmente, tirar os planos e leis do papel”, ressaltou.
Após a fala de Ermínia, houve um debate com os presentes. Rodrigo Perpétuo, do ICLEI, fez um retrospecto sobre a história do Brasil e disse que mesmo com os grandes avanços, especialmente no Brasil, conquistados no decorrer os séculos, ainda vivemos uma realidade desigual, que retrocede todo esse processo, inclusive na sustentabilidade. “É possível mudar? Toda a cidade é única porque ela é diversa e a resposta vai conforme a visão de cada um. Tenho uma filha de seis anos e perguntei qual futuro gostaria para Belo Horizonte (MG), onde moramos. Ela me disse: ‘queria ficar mais tempo com a mamãe’. Eis aí uma pista”, refletiu. Também exemplificou com o programa Vila Viva, que promoveu plano de urbanização no Aglomerado da Serra, Centro-Sul de BH.
Outro destaque no evento foi as chamadas Smart Cities (para entender, confira link de texto da Fundação Getúlio Vargas) que utilizam da tecnologia para melhoria de diversos aspectos, mobilidade, por exemplo, aos seus habitantes. “A tecnologia é uma grande aliada para cidades, mas é preciso também valorizar todo o conjunto”, endossou Diego Conti. E concluiu: “Não é pensar somente em apenas um aspecto e em uma região é pensar toda a cidade, com lideranças que ouçam todos, que agreguem todos, mas são vários contextos envolvidos. Resiliência é a melhor palavra para expressar o que um bom líder deve ser, pois sabemos que liderar não é fácil.”.
Cidades mais sustentáveis, mais humanas e com mais resiliência, uma tríade ainda difícil de ser alcançada, porém com um futuro desejável e, quem sabe, possível.
* Keli Vasconcelos é jornalista freelancer e escreve crônicas, contos, resenhas. Mais elo Twitter, LinkedIn e Tumblr @keliv1
Crédito da foto no alto: (a partir da esq.) Rodrigo Perpétuo, Diego Conti, Ermínia Maricato e Dal Marcondes/Foto: Keli Vasconcelos