Muitas vezes, uma alteração repentina de hábitos, como a adoção do isolamento forçado, utilizado como um das formas de conter a proliferação da COVID-19, tem o poder de causar mudanças objetivas na rotina das pessoas. Não apenas na forma de trabalhar, com o home office ganhando espaço, como também no jeito de consumir produtos e serviços, especialmente os de primeira necessidade. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), enquanto as empresas de food service (restaurantes, bares e bufês) amargaram queda de 70%, as vendas no varejo (físico e eletrônico) avançaram 20%. Tão importante quanto a quantidade tem sido a qualidade do que se compra: “Nossas vendas cresceram 300% no primeiro mês de isolamento social”, festeja Júlio César Benedito, gerente geral de A Boa Terra, empresa produtora e distribuidora de alimentos orgânicos, baseada em Casa Branca, no interior de São Paulo.
De acordo com o executivo, a mudança no patamar de vendas veio para ficar. “Nossa previsão inicial era encerrar o ano com elevação de 20% no faturamento em relação a 2019. Agora, ampliamos a projeção para 60%”, diz. “As pessoas começaram a olhar mais para si mesmas e a valorizar ainda mais a forma como cuidam da própria saúde”, destaca Violeta Stoltenborg, responsável pela área de marketing da empresa de orgânicos.
Pandemias à parte, é certo que A Boa Terra vem se preparando para fortalecer seu papel neste segmento. Uma das sacadas deste ano foi a adoção das vendas por assinatura, iniciadas em março. A partir de R$ 36 o consumidor recebe em casa uma cesta com produtos variados. As vantagens deste sistema é que a empresa pode planejar a produção e a colheita, a partir de uma demanda com maior grau de previsibilidade. Hoje, 17% das cerca de 700 entregas semanais já são para clientes de assinatura. “Além das cestas com produtos definidos por nós, temos uma modalidade personalizada, na qual cada pessoa monta a sua cesta”, explica Violeta.
A inovação e pioneirismo são traços que fazem parte do DNA da empresa fundada em 1981 pelo casal de imigrantes holandeses Joop Stoltenborg e Tini Schoenmaker. A Boa Terra foi uma das primeiras experiências de produção orgânica em larga escala, no Brasil. “Éramos considerados uma família alternativa, até meio loucos pelos vizinhos”, diverte-se Violeta, a caçula dos três filhos do casal. De fato, se hoje ainda provoca uma certa estranheza falar em produtos orgânicos, imagine há 40 anos!
A conversão do casal de pioneiros a esta filosofia de produção agrícola também foi lenta e gradual. Em vídeo publicado na página de internet da empresa, Joop fala sobre sua infância, em um sítio orgânico, no interior da Holanda, o contato com herbicidas e a agricultura mecanizada, no Canadá, onde trabalhou por dois anos. O desembarque no interior de São Paulo, na casa de parentes, se deu ao término de uma jornada quase heroica, em 1966, após seis meses cruzando 16 países, percorrendo um total de 40 mil quilômetros a bordo de um Fusca.