Por Rosenildo Gomes Ferreira, especial para Coalizão Verde (1 Papo Reto e Neo Mondo)
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que entrou em vigor em 2010 por meio da Lei nº 12.305/10, trouxe uma série de obrigações para os produtores, importadores, fabricantes e revendedores de produtos de consumo.
A lógica desse processo é que desde os saquinhos plásticos e copinhos descartáveis de café, passando por geladeiras e computadores, até automóveis, tudo tenha um destino seguro ao final de sua vida útil: sendo reincorporado no processo produtivo do setor (o que já ocorre largamente na produção de latas de alumínio, por exemplo) ou servindo de base para novos produtos (como a transformação de garrafas PET pós-consumo em camisetas).
No rastro da lei surgiram muitos embates, especialmente na formação das cadeias produtivas responsáveis pela logística reversa: o retorno da embalagem para um ponto de descarte apropriado. Também despontaram inúmeras iniciativas exitosas de fortalecimento de atividades meio, como as cooperativas de coletores e as unidades recicladoras, encarregadas de alimentar a indústria de reaproveitamento de matérias primas.
Aos poucos, no entanto, começou-se a descobrir que os números não estavam exatos por conta da chamada colidência das notas fiscais que são emitidas para a comercialização de materiais reciclados. Como saber se as toneladas computadas por determinada empresa ou setor está correta? Como medir se o volume de redução de gases de efeito estufa anunciado pela empresa ou o setor espelham a realidade? Foi de olho nesses desafios que se apostou na criação de uma empresa certificadora para o setor de reciclagem e logística reversa. Lançada em agosto último com o aporte de uma empresa norte-americana, a Central de Custódia conseguiu a adesão das entidades gestoras das principais cadeias produtivas instaladas no Brasil.
Trata-se de um segmento que movimenta cerca de R$ 105 milhões, por ano, resultado da gestão de 800 mil toneladas de resíduos. “Nosso plano de negócio previa a certificação de 150 mil toneladas de embalagens ao final de 2021. Mas a expectativa é quase triplicar esse volume, fechando o período com 400 mil toneladas”, conta o diretor de Operações da Central de Custódia, Fernando Bernardes. “Esse montante representa metade de tudo que é destinado à logística reversa no Brasil.”
O rápido crescimento fez com que o time comandado por Fernando já colocasse no radar os demais países do continente. “Abrimos conversas com empresas da Colômbia e do Chile”, adianta o executivo. Ele diz que o fato de o Brasil ter saído na frente, garantiu uma importante curva de aprendizagem para empresas e agentes do setor público. Afinal, lá se vão mais de 10 anos da implantação da PNRS. Mesmo assim, a questão segue complexa tanto por aqui quanto nos países vizinhos. “Cada país possui particularidades em sua cadeia produtiva e de consumo, o que nos obriga a desenvolver um serviço bastante específico para cada mercado”, conta.
Apesar do amplo conhecimento acadêmico – Fernando é graduado em engenharia ambiental e possui doutorado em saneamento e recursos hídricos – e da vasta experiência no setor privado – a partir de consultorias em projetos de saneamento básico, com ênfase no gerenciamento de resíduos sólidos urbanos –, o executivo conta que ele e sua equipe precisaram de nada menos que 12 meses para entender a cadeia de logística reversa brasileira.
As apostas sobre o segmento de logística reversa ganharam um novo impulso a partir de compromissos assinados no âmbito do Acordo de Paris, e ratificados na COP26, ocorrida recentemente, em Glasgow (Escócia). As autoridades brasileiras, por exemplo, saíram do encontro falando em instalar pontos de coleta de lixo eletrônico, até abril de 2022, nas principais cidades da Amazônia Legal: Manaus (AM), Rio Branco (AC), Macapá (AP), Belém (PA), Porto Velho (RO), Boa Vista (RR), Palmas (TO), Cuiabá (MT) e São Luís (MA).
Por outro lado, cresceu a disposição das empresas em se mostrarem como neutras na geração de resíduo (Net Zero), em função da disseminação do conceito ESG, que valoriza a preocupação com ações ligadas ao meio ambiente, ao social e à governança corporativa. Independentemente de todas as perspectivas, os números mostram que ainda há muito por ser feito. Exemplo: apenas quatro das 27 unidades da federação possuem regulamentação para atividade de logística reversa. Além disso, os lixões ainda são uma realidade em praticamente todas as cidades do país.
É neste contexto que cresce a importância de iniciativas como a Central de Custódia. Afinal, mais que fazer, é preciso fazer da forma correta. “Nosso objetivo é trazer transparência e economia à cadeia de reciclagem e logística reversa”, finaliza Fernando.
Artigo atualizado às 12h, de 10/12/2021, para corrigir a data nas aspas, no 5º parágrafo.