Afroempreendedores apostam em conexões para driblar o racismo estrutural

Afroempreendedores apostam em conexões para driblar o racismo estrutural

O segundo, e último dia, do Festival Afrofuturismo, realizado em Salvador, foi marcado pelo debate sobre as oportunidades de negócios na Região Metropolitana da capital da Bahia. As interlocuções aconteceram por meio de rodas de conversa, palestras e o Meet Up Corporativo que reuniu representantes de grandes empresas: iFood,Unilever, Pepsico e Youtube, com empreendedores locais, na Casa 17, no Pelourinho. Durante o meet up, o cofundador da Vale do Dendê, Paulo Rogério Nunes, destacou a importância desses encontros para o fortalecimento de laços e o estabelecimento de conexões. “Muitas vezes, o que o empreendedor precisa é fazer parte de um ecossistema que o aproxime de potenciais parceiros de negócios”, disse. Boa parte dos empreendedores inscritos no meet up tiveram seus negócios acelerados pela Vale do Dendê, a partir de 2018. 

“Esse processo foi importante para eu me descobrir como empreendedora”, contou Camila Reis, fundadora da Óleos da Mi, empresa que começou com fito cosméticos capilares e está ampliando a linha de produtos. Outra que passou pelas dinâmicas desenvolvidas pela aceleradora foi a chef Deliene Mota, proprietária da rede de restaurantes Encantos da Maré. Ela é considerada como um dos grandes casos de sucesso entre os 300 empreendedores que passaram pela Vale do Dendê. “A aceleração mudou minha forma de encarar meu negócio”, destacou. “Consegui ter mais foco e desenvolver um plano de crescimento.” 

montagem vale o dende meet up 1 papo retoCamila (esq.), da Óleos da Mi, Deliene, do Encantos da Maré, Paulo Rogério, da Vale do Dendê, e Keila, da Maro Maro Café

 

Quem também está apostando na gastronomia focada em eventos é Keila Costa, criadora do Maro Maro Café, uma empresa com propósito social que reúne doces e outros quitutes produzidos por mulheres de Santo Amaro da Purificação, cidade do recôncavo baiano. “Nosso objetivo é trazer para os eventos, o trabalho de mulheres fantásticas e, com isso, gerar impacto social”, destacou. A empresa representa uma guinada na trajetória de Keila, que fez carreira no mundo corporativo atuando com gestão estratégica em empresas privadas. 

Apesar dessas e tantas outras histórias de sucesso, ainda existe um enorme fosso entre os empreendedores afro-brasileiros (pretos e pardos, de acordo com a classificação do IBGE) e os demais. Mesmo com alguns avanços, as dificuldades geradas pelo racismo institucional continuam dando o tom quando o assunto é trabalho, renda e acesso a crédito. 

É isso que mostra estudo recém divulgado pelo Sebrae, com base nos dados da PNAD referente ao período junho-setembro. Apesar de representarem 52% do número total de empreendedores, registrados ou não, os negros possuem renda menor que os brancos. Entre aqueles com faturamento de até dois salários mínimos, 77,6% são pretos ou pardos, enquanto na faixa superior (acima de cinco salários mínimos) apenas 4,3% são negros.

Reconexão com a África

Como o racismo institucional é um dado da realidade e cuja eliminação ainda demandará muitos esforços, o jeito é criar estratégias que permitam superar as barreiras que surgem pelo caminho. E ao que parece, a reconexão com a África é uma das grandes apostas dos organizadores do Festival. Paulo Rogério contou que as parcerias com grandes empresas privadas e entidades governamentais possibilitaram a participação de representantes de 13 nações, com destaque para Gana, que montou um espaço colaborativo no Pelourinho. A ideia é que o local se torne uma vitrine da cultura e da economia do país africano.

Pelo lado business, quem está de olho na conexão dos dois lados do Atlântico é a Linhas Aéreas de Angola (TAAG), cuja ambição é se tornar a principal opção para os brasileiros que desejam conhecer o continente. “A partir do dia 11 de dezembro teremos seis voos por semana saindo de São Paulo”, contou Luciana Salzano, responsável pelo escritório local TAAG. Apesar de voar para o Brasil desde 1985, a TAAG sempre se mostrou tímida em relação ao mercado local. Seu foco sempre esteve direcionado para o público corporativo, em especial os funcionários de empresas dos setores de energia e construção civil, que mantêm negócios na África. 

A nova estratégia da TAAG surge em um momento no qual diversas companhias aéreas estão retomando os voos entre os dois países, como é o caso da TAM, que reativou as rotas para a África do Sul no início de setembro. “Queremos posicionar a TAAG como uma opção para quem deseja chegar a diversos destinos do continente africano, com conforto e um serviço de qualidade”, destacou. 

 

Veja um pouco da trajetória do Festival Afrofuturismo

 

 

*O jornalista viajou a Salvador a convite da Vale do Dendê