SIX: o poder de falar e escolher

SIX: o poder de falar e escolher

Poucos reconhecem o privilégio de poder contar sua história e fazer suas próprias escolhas. No musical britânico SIX, agora na Broadway, aqui em Nova York, seis atrizes “sambam na cara desse privilégio”, ao assumirem a voz de rainhas inglesas cuja fama está diretamente ligada a um homem: o rei Henrique VIII.

Conhecido como o fundador da Igreja Anglicana, o monarca do Reino Unido entrou para a história ao se casar seis vezes, de acordo com a Historic Royal Palaces, que administra diversos palácios na Inglaterra.

O começo dessa história está ligado ao fato de Henrique e sua primeira esposa, Catarina de Aragão, não terem conseguido gerar herdeiros homens. Determinado a ter um sucessor do sexo masculino para não colocar o poder de sua família a perder, Henrique “dispensou”  Catarina e casou-se com Ana Bolena, sem a aprovação do papa, então a única autoridade habilitada a anular casamentos.

O episódio levou ao rompimento da coroa britânica com a Igreja Católica, abrindo espaço para a criação da Igreja Anglicana. Essa história não parou por aí. Henrique e Ana também não conseguiram gerar herdeiros homens, e após ser acusada de adultério e rebelião contra o rei, ela foi decapitada.

É neste momento que entra em cena Jane Seymour, que ele desposou após a “viuvez forçada”. Foi aí que o monarca, enfim, conseguiu seu tão desejado herdeiro. Mas a história terminou mal para a rainha que morreu de complicações do parto, logo após dar à luz ao varão, de acordo com a Historic Royal Palaces.

Henrique VIII ainda se casaria outras duas vezes: com Ana de Cleves e Catarina Howard. Mas o relacionamento não terminou bem em ambos os casos. Depois de ter o casamento anulado, a primeira viveu até a morte na Inglaterra. Catarina, contudo, teve um final trágico: foi decapitada sob a acusação de adultério.

Melhor sorte teve Catarina Parr, com quem Henrique ficou até a morte, ocorrida quatro anos depois do matrimônio – quem sabe o que teria acontecido se ele tivesse vivido mais…

Quando se fala dessas mulheres, a referência é geralmente “a primeira esposa”, “a segunda esposa”, “a terceira esposa”, e por aí vai... O foco é sempre direcionado para Henrique, suas escolhas, sua obsessão em gerar filhos e as sucessivas trocas de esposas. Mas no musical SIX, elas retomam seu poder de fala, contando elas mesmas como conheceram o monarca e como eram conhecidas na corte. Unidas, cada uma lidera uma música, com as outras de apoio vocal. Elas respondem com muita força a Henrique e suas ações.

Apesar de se tratar de mulheres de tempos de reis e rainhas, o musical tem uma pegada moderna, que amplifica essa tomada de poder. O figurino e a música de cada ex-rainha são inspirados em uma cantora pop atual: Beyoncé, Ariana Grande, Adele, Rihanna, Lily Allen e Alicia Keys, de acordo com o folheto distribuído na entrada do teatro.

Além disso, a banda que acompanha as canções é toda composta por mulheres. Entrei esperando uma peça de música clássica, falas antigas e saias longas. Saí arrepiada. A energia do show é maravilhosa. Ver aquelas mulheres tomando conta do palco faz sentir que você pode qualquer coisa.

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 Até na diversidade racial o show acerta em cheio: na Broadway, tem quatro rainhas negras e duas brancas. Em Boston, é melhor ainda, com uma asiática, três negras e duas brancas. No folheto e no site, a plateia pode conhecer mais detalhes sobre a vida de cada uma das rainhas, seus interesses, curiosidades e como ficaram conhecidas na história. Catarina Parr, por exemplo, foi a primeira mulher inglesa a publicar livros em inglês com o próprio nome, conta o panfleto.

O tal poder da escolha surge com mais força nos momentos finais, quando as mulheres, que até então viveram uma disputa para serem escolhidas pela plateia como melhor rainha, decidem que não faz sentido tentar ser melhor que as outras. Um final um tanto clichê, mas que é muito poderoso no contexto da peça.

Afinal, essas são mulheres que tiveram, uma por uma, o fim de suas vidas ditado por um homem, mas, no contexto da ficção, se unem e escolhem vencer juntas, deixando de considerar os desejos do rei Henrique VIII.

Se você, caro leitor, tiver a chance, não deixe de assistir o musical. Infelizmente, ele não está disponível em plataformas de streaming e não tem, até o momento, apresentações marcados para o Brasil. Apenas no Reino Unido, na Austrália, na Holanda e na América do Norte. Para aprender mais sobre as rainhas, o Historic Royal Palaces tem páginas sobre cada uma, e para quem não domina o inglês, pode consultar o site Aventuras na História e algumas séries e filmes em versões dubladas ou legendadas (links abaixo).

 

Catarina de Aragão

Série: The Spanish Princess

Historic Royal Palaces

Ana Bolena 

Série: Sexo, Sangue & Realeza

Filme: A Outra Historic Royal Palaces

Historic Royal Palaces

Jane Seymour

Aventuras na História Historic Royal Palaces

Ana de Cleves

Aventuras na História Historic Royal Palaces

 Smithsonian Magazine: 

Catarina Howard

Aventuras na História Historic Royal Palaces

Catarina Parr

Aventuras na História Historic Royal Palaces 

 

 Fotos: Elenco principal do tour de SIX pela America do Norte, que passou por Boston. Credito: Joan Marcus/divulgação)

 

Isabela Rocha

Autor: Isabela Rocha

Sobre o/a Autor(a) Isabela Rocha é jornalista freelancer. Apaixonada por escrita, comunicação e justiça social, seu sonho profissional é trabalhar para o avanço da igualdade de gênero e do combate ao racismo. Ela acredita no poder democrático das notícias e sempre busca contar histórias relacionadas à diversidade para normalizar a vida de minorias sociais.


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